Stanley Kubrick tinha certas obsessões em sua curta, porém excepcional, filmografia. Em sua primeira empreitada no mundo cinematográfico, abordou questões envolvendo a militarização no filme Medo e Desejo (1953). Após alguns anos, fez um drama se utilizando da temática de guerra, Glória Feita de Sangue, em 1957. Pouco menos de dez anos depois, em 1964, Kubrick se dispôs a discutir e colocar o seu ponto de vista sobre a moralidade das potências bélicas acerca do conflito por zonas de influência ao redor do mundo, na sátira Dr. Fantástico.
Mesmo depois de três filmes abordando assuntos semelhantes, o diretor lançou mais duas obras que iriam retratar as suas antigas obsessões: Barry Lyndon, de 1975, e, se consagrando como o seu último filme de guerra, Nascido para Matar, uma carta de ódio aos responsáveis pela Guerra do Vietnã – o momento que intensificou a frágil relação entre Estados Unidos e União Soviética durante a conhecida Guerra Fria. Impondo um ritmo particular e construindo uma atmosfera ameaçadora, Kubrick entrega sua visão sobre ocorrido de maneira ácida, crítica e extremamente dolorosa.
A sequência inicial sugere o tom irônico e crítico que irá permear a obra; alguns planos focados nos personagens tendo seus cabelos raspados, concretizando a entrada no ambiente militar, enquanto, ao fundo, ouve-se Hello Vietnam (Johnny Wright), criando o contraste entre o tom sereno da música e a expressividade vazia dos atores. Logo depois, há uma das sequências mais memoráveis da história, onde o Sargento Hartman se encontra pela primeira vez com o pelotão. Tratando a cena a partir de um senso técnico apurado, Kubrick entende como aproveitar ao máximo o monólogo apavorante de Ronald Lee Ermey (repare os planos sequência que acompanham o ritmo do Sargento e o ambiente (as janelas e o verde claro), que refletem a frieza do momento), intérprete de Hartman e que foi Sargento na vida real, durante sua passagem no Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos. Por essa experiência, ficou fácil transmitir em suas falas e gestos toda a rigidez necessária, onde ações agressivas, psicologicamente e fisicamente falando, apelidos maldosos, e pressões constantes são elementos totalmente normalizados.
O pelotão é constituído por Leonard Lawrence, apelidado de Pyle, interpretado por Vincent D’Onofrio – que marcaria a carreira com este filme -, por J. T. Davis (Matthew Modine), o Joker e pelo Cowboy, de Arliss Howard; além de outros que servem como elenco de apoio. Pyle é o soldado que demonstra dificuldades mentais e físicas na conclusão de tarefas do treinamento. As dificuldades passadas por ele são exaltadas pelo comprometimento absurdo de D’Onofrio ao papel, ficando entre os melhores personagens da filmografia de Kubrick. A falta de determinação e os obstáculos vividos pelo soldado transformam o treinamento militar em um espetáculo conduzido por Hartman, ao passo em que ele constantemente zomba e abusa psicologicamente de Pyle. Contudo, os que acabam sofrendo as consequências pelos atos falhos de Pyle são os integrantes do próprio grupo.
Dessa maneira, Kubrick trata de observar a academia militar para a Guerra do Vietnã por uma perspectiva altamente combativa, ridicularizando – de maneira sutil – o preparo para o Vietnã. Contudo, não é porque o assunto é tratado com certa ironia, que o diretor esquece de discuti-lo com seriedade. O que vemos, primeiramente, como uma simples – se podemos chamá-la assim – pressão e rigidez militar, se transforma em uma conclusão verdadeiramente diabólica. A trama parece que se estenderá do começo ao fim do filme, porém, termina em apenas 45 minutos, na mais pura e brilhante “linguagem kubrickiana”. Quando Alfred Hitchcock fez Psicose (1960), e gravou a famosa cena da banheira – violentíssima para a época -, ele queria incutir uma certa angústia aos espectadores, que se sentiriam durante o resto do filme ameaçados com a promessa de uma cena ainda mais assustadora, mas que nunca iria se cumprir. O que Kubrick faz é justamente isso, criando uma sequência angustiante, e que fica conosco até os últimos minutos, embora nunca mencionada posteriormente.
Linguagem kubrickiana, isto é, a linguagem rebuscada e perceptível com certa regularidade nos filmes de Kubrick. Porém, após os primeiros quarenta e cinco minutos, Nascido para Matar vira um filme de guerra extremamente competente, mas não tão único como outras obras que só Kubrick faria, já que encontramos similaridades em relação a outros do gênero. O ambiente do campo da marinha dá lugar ao campo de guerra que se tornou o Vietnã, e Joker reaparece como jornalista militar. Embora não tenha detalhes minuciosos, há diversos toques provenientes da genialidade do diretor. Enquanto a tropa, constituída por Joker e Cowboy, integram missões potencialmente fatais, ocorre uma cobertura jornalística auxiliada por câmeras e microfones, na qual a metalinguagem trata de exemplificar como a guerra também era vista através da teatralidade propagandística. Onde os relatos dos soldados fizessem alusão a estrutura de um reality show.
Outra ferramenta para criticar o genocídio que a Guerra do Vietnã se tornou é o uso das personagens femininas. A primeira mulher que realmente tem certa importância narrativa é uma vietnamita que está sendo prostituída por vietnamitas locais em troca de armas e dinheiro. Contudo, o que se vê é o embate constrangedor entre soldados – às vezes até pelo tamanho do órgão – para ver quem seria o primeiro a ter chance com a moça, fundamentando a imbecilidade e a selvageria que o exército americano carregava. No terço final do filme, há a morte de uma jovem vietnamita que marca todos os soldados profundamente, e que Kubrick se utiliza dos mesmo planos inicias – da raspagem do cabelo – para julgar os responsáveis por aquele ato violento. De certa forma, Kubrick tenta iluminar a consciência dos protagonistas com um “tapa na cara” moral, esvaziando o imaginário perverso da guerra, e entregando a dura e crua realidade.
Podemos pensar em Pyle, nas vietnamitas, ou até no Sargento Hartman, e todos terão o mesmo destino sombrio e cruel. A intenção de Stanley Kubrick, portanto, é produzir um incômodo profundo na mente do espectador, deixando-o pensar em como a guerra pode trazer consequências duras e difíceis para aqueles que estão diretamente ou indiretamente ligados à ela. É ironizar – e até mesmo satirizar – passagens marcadas por ódio e violência, seja o ríspido Sargento como caricatura, ou os soldados durões que só conseguem se provar por meio do tamanho do membro. Nascido para Matar serve justamente para destruir essas concepções imaginárias sobre a postura e a moralidade do homem, evidenciando o que elas tentam esconder: a mediocridade humana.
Dirigido por Max Barbakow, Palm Springs teve seu lançamento em Janeiro no festival de Sundance e estreou recentemente no serviço de streaming da Hulu. O longa se trata de uma comédia romântica misturada com uma ficção científica que aborda um loop temporal como seu tema principal.
A trama gira em torno de 9 de Novembro, onde Nyles (Andy Samberg) acorda com um casamento para ir. Logo de início somos introduzidos ao personagem e vemos que ele não está se importando com a ocasião, se preocupando apenas em beber e usar suas roupas casuais – inclusive, utilizando elas no evento. Durante o casamento, Nyles conhece Sarah (Cristin Milioti) e após isso um incidente acontece e descobrimos que Nyles está vivendo o mesmo dia várias vezes e, como consequência do incidente, Sarah começa a viver o loop temporal com ele. Por mais que o primeiro ato do longa apresente algumas piadas que, ao meu ver, foram bem forçadas, a partir do segundo ato ele engrena e toma seu rumo para se tornar uma boa experiência. O roteiro é bem simples, porém muito bem executado.
Por mais que a trama tenha seus pontos originais, ela segue todos os clichês de uma comédia romântica e de filmes que abordam o loop temporal – tais como A Morte te dá Parabéns ou o clássico Feitiço do Tempo: ambos os protagonistas se envolvem romanticamente com o passar do tempo e vivem todos os dias como se fossem os últimos, fazendo coisas que normalmente não fariam caso fosse um dia rotineiro enquanto procuram formas de resolver a situação. Mas isso não quer dizer que é de todo ruim, pois a forma que Barbakow dirige o longa faz com ele foque na construção dos personagens envolvidos na situação.
Como foi dito acima, o roteiro é simplório porém nota-se que ele não é o foco da trama. O foco (e a originalidade do filme) é desenvolver seus personagens a partir da situação específica – não sabemos nada a respeito do passado deles, apenas o que eles conversam entre si e o que cada um desenvolve a partir de determinadas situações. A construção dos personagens combinada com a química entre Andy Samberg e Cristin Milioti são os pontos altos do filme. Mesmo que tenha um personagem de apoio, que é interpretado por J.K. Simmons – e que protagoniza a melhor cena do longa, a trama apenas foca nos dois protagonistas e no desenvolvimento de sua relação durante o decorrer do filme. O elenco trabalha bem e Samberg foi a melhor escolha para interpretar Nyles.
Palm Springs é uma grande surpresa de 2020. O longa trás junto com seus clichês de comédia romântica uma reflexão acerca da rotina e de relacionamentos, além de funcionar bem em sua execução e apresentar um final satisfatório. É um filme que, mesmo com um roteiro simples, é extremamente divertido de se ver e que cumpre a sua função de entreter o telespectador durante seus noventa minutos de exibição
Nota: 3/5
Durante o casamento de sua irmã (Tala, interpretada por Camila Mendes), Sarah (Cristin Milioti) testemunha a estranha perseguição sofrida por Nyles (Andy Samberg), um dos convidados com quem ela estava passando momentos bastante agradáveis. Ao seguí-lo para dentro de uma caverna, a dama de honra se vê presa num loop temporal do qual apenas eles parecem ter ciência, vivendo o mesmo dia de novo e de novo.
Tudo se complica quando ela descobre que Nyles está preso há muito mais tempo do que ela e não faz a menor ideia de como sair dali.
Palm Springs já está disponível no serviço de streaming Hulu.
A Vastidão da Noite (The Vast of Night) foi lançado originalmente ano passado, no festival Slamdance e foi bastante aclamado pelo público. Neste ano, a Amazon adquiriu os direitos de distribuição e o filme chegou recentemente no serviço de streaming, Prime Video. O longa apresenta um excelente roteiro e se solidifica como uma ótima homenagem aos clássicos como a série The Twilight Zone de 1959, Contatos Imediatos de Terceiro Grau (dir: Steven Spielberg), dentre outros do gênero sci-fi.
A trama de passa em uma pequena cidade, durante a década de 50 e se desenrola durante uma noite. Durante os eventos está ocorrendo um jogo de basquete local e, enquanto o longa de desenrola, acompanhamos o radialista Everett e Fay, a operadora da central telefônica. Após perceberem uma frequência de rádio estranha e receberem ligações de diferentes pessoas relatando um objeto não identificado nos céus, ambos decidem investigar o que está acontecendo.
O longa é o primeiro dirigido por Andrew Patterson e se apresenta como um excelente autoral. Com baixo orçamento, o diretor conseguiu criar uma trama sustentada através dos personagens e da tensão criada através da fotografia e de sua edição. Em conjunto com a sua estética e sua ambientação, o filme prende o telespectador e cria uma boa imersão para que o mesmo se sinta intrigado com a situação – mesmo com a ausência de efeitos especiais.
O único problema do longa é que ele pode se apresentar arrastado em alguns momentos, isso pois ele se sustenta apenas nos diálogos dos personagens e nos eventos que estão sendo anunciados pelos ouvintes da rádio através de ligações para a central. Entretanto, o filme apresenta a duração certa de exibição para que o telespectador não se sinta entediado e o mesmo poderia ser um excelente episódio de uma série do gênero.
É bem complicado fazer uma crítica sobre o longa sem expor muito sobre sua trama e a experiência que o público virá a ter durante sua exibição e, caso isso seja feito, o filme perderá completamente a graça. Entretanto, mesmo que não tenha tido tanta divulgação por parte da Amazon Prime Video, A Vastidão da Noite é um excelente trabalho autoral que, apesar de suas limitações orçamentárias, consegue trazer uma experiência sólida ao telespectador e se torna um bom filme do gênero. Além disso, é uma linda homenagem aos clássicos que consolidaram o sci-fi no que ele é atualmente.
Nota: 4/5
No período da Guerra Fria, enquanto acontece a corrida espacial entre os Estados Unidos e a União Soviética, dois adolescentes de uma cidadezinha americana são obcecados pelo rádio. Quando eles descobrem uma estranha frequência de ondas aéreas, suas vidas e o mundo inteiro podem estar prestes a mudar drasticamente.
Entre as décadas de 50 e 70 foi desencadeada a Guerra do Vietnã, servindo como palco para a mais nova obra-prima de Spike Lee, porém, não é este o palco principal. O confronto, no caso, serve apenas para introduzir a trama e o objetivo dos personagens, além de trabalhar seus traumas e seus conflitos internos (e externos). O palco principal de ‘Destacamento Blood’ é o trauma passado, e como ele deixa feridas que custam – ou que nunca – cicatrizam, e Lee trabalha isso com maestria em seu novo título lançado na Netflix.
A história de ‘Destacamento Blood’ gira em torno de quatro amigos, veteranos de guerra que lutaram no Vietnã, que decidem retornar ao país para recuperar os restos mortais de seu companheiro, Stormin’ Norman (interpretado por Chadwick Boseman) e com uma missão secundária: encontrar um baú repleto de ouro que foi deixado lá durante a guerra. Entretanto, há diversos obstáculos na missão e transtornos psicológicos desencadeados pelos traumas passados no local que servem como uma forma de resolução entre conflitos internos e externos com os membros do grupo.
A trama se desenrola a partir de cenas nos dias atuais e de flashbacks do conflito, mostradas em tela de forma genial com alteração na dimensão da tela de forma leve e sutil – dando um aspecto de documentário gravado na época, graças à paleta de cores e ao contraste. Em apenas três minutos de longa, já somos apresentados a problemática que Spike Lee quer criticar, através de um mini documentário sobre o contexto político-social e a luta contra a situação e o racismo. Além disso o diretor também utiliza, em cortes, imagens com personalidades para homenagear as pessoas envolvidas na luta e reconhecer o seu papel social, inclusive citando Malcolm X e Martin Luther King durante a trama. A crítica e o discurso de Lee são claros durante todo o filme e é interessante a forma que o mesmo faz através dos discursos de Norman durante os flashbacks do Vietnã.
A forma como Spike Lee trabalha com a história da América e em como cada acontecimento repercute entre os personagens e a reação dos mesmos diante do ocorrido é lindo de se ver, sendo um filme que trabalha com memória e abre debates importantes atualmente. Um outro ponto interessante é ver a interação entre os quatro veteranos, o quanto discordam entre si e suas lutas pessoais durante a trama para superar os traumas do passado e conquistar sua redenção pelos erros cometidos – destaque aqui para o personagem de Delroy Lindo, que apresenta a melhor atuação do longa e surpreende a todos com seu desenvolvimento. Com toda a certeza, o ator será também destaque nas futuras premiações.
Um problema observado por mim ao longo do filme foi a insistência de mostrar o boné ‘Make America Great Again’, da campanha presidencial do Trump. De início, ele aparece e ok, serve para apresentar a ideologia política do personagem. Porém, após isso e em todo o momento ele vira foco no enquadramento e se torna insistente demais por parte do diretor. Spike Lee deixa sua mensagem e sua crítica claras durante todo o longa, não era necessário mostrar esse elemento toda hora. Outro problema que achei durante o longa foi o roteiro durante o segundo ato do longa, que se torna um pouco preguiçoso pela fácil resolução do objetivo que os levou ao Vietnã e conveniente com um obstáculo que surge durante a missão, além de se tornar também um pouco arrastado depois de um tempo, Entretanto, isso muda na transição para o terceiro ato. Mas mesmo com esses problemas, o segundo ato ainda tem seus momentos e o seu brilho no filme.
Mesmo apresentando claras homenagens aos longas do gênero, ‘Destacamento Blood’ não é um apenas mais um filme sobre guerra, mas sim é mais uma obra-prima de Spike Lee. Além de ser uma história sobre a luta pela igualdade e pelo que é certo, sobre a superação de traumas passados e sobre redenção, é um filme importantíssimo de ser visto e debatido diante do atual contexto histórico que vivemos, principalmente agora com o movimento Black Lives Matter após o assassinato covarde de George Floyd. Vale a pena assistir e conferir outras obras do diretor, como o seu último lançamento ‘Infiltrados na Klan’.
Nota: 4/5
O vencedor do Oscar Spike Lee apresenta Destacamento Blood – a história de quatro veteranos da Guerra do Vietnã: Paul (Delroy Lindo), Otis (Clarke Peters), Eddie (Norm Lewis) e Melvin (Isiah Whitlock, Jr.). Acompanhados do filho de Paul (Jonathan Majors), eles retornam ao Vietnã em busca dos restos mortais do líder de seu esquadrão (Chadwick Boseman) e de um tesouro escondido.
No final de 2017, foi lançado nos cinemas ao redor do mundo Liga da Justiça – o primeiro filme da equipe de heróis da DC. Entretanto o produto final não foi o mesmo prometido durante sua divulgação, apresentando diversas alterações em sua edição, com cortes, refilmagens e o tão comentado cgi para esconder o bigode de Henry Cavill.
O motivo disso foi por conta do afastamento de Zack Snyder da direção. Originalmente o diretor tinha controle total do filme, porém houve uma tragédia familiar e Snyder foi substituído do cargo por Joss Whedon, que modificou toda a obra original de Snyder ao eliminar cenas essenciais para a trama e acrescentando outras com a clássica ‘fórmula Marvel’ de humor, inclusive sexualizando a Mulher-Maravilha em uma cena onde o Flash cai em seus seios. O intuito do diretor era transformar o que tanto criticam nos longas do Snyder em uma versão mais próxima do que ele trouxe em The Avengers (2012), entretanto não deu certo.A insatisfação dos fãs com o conteúdo apresentado e com as alterações de Whedon fez com que um movimento nascesse: o #ReleaseTheSnyderCut. Por três anos e em diversas redes sociais, especialmente no Twitter, os fãs promoveram a tag para que a Warner Bros. desse uma chance e lançasse a versão original de Zack Snyder – a versão que os fãs queriam ver desde o desfecho de Batman vs Superman: A Origem da Justiça, em 2016.
Após três anos e diversas informações reveladas por Zack Snyder sobre seus planos para o filme, finalmente, foi divulgado durante a transmissão de Homem de Aço no Vero e com a presença de Henry Cavill, que o Snyder Cut existe e que será lançado no novo serviço de streaming (clique aqui para saber mais). Oficialmente, Zack Snyder’s Justice League será lançado em 2021 no HBO MAX.
Agora que está confirmado, a pergunta é: o que podemos esperar do Snyder Cut?
Segundo Zack Snyder, o diretor não assistiu o corte de Whedon que foi aos cinemas e afirmou que provavelmente apenas 1/4 de seu filme foi apresentado nas telonas. Ou seja, agora veremos totalmente a versão de Snyder. Sua versão poderá ser apresentada em um filme de quatro horas ou ser dividida em seis episódios – o que, de fato, será o melhor formato pois sabemos a quantidade de conteúdo que a versão original apresenta e, com esse formato, vai dar mais tempo para desenvolver a trama, os personagens e dar um final digno ao longa.
Durante esses três anos de ação do movimento #ReleaseTheSnyderCut, o diretor revelou na rede social Vero vários detalhes sobre seu corte original. Logo, sabemos mais ou menos o que será visto no longa: o traje preto do Superman, alterações na cena do renascimento do Superman e do seu retorno, a presença de mais Lanternas Verdes ao longo do filme e, tão esperado pelos fãs, a presença de Darkseid. O diretor revelou que o vilão apareceria no final da luta final com o Steppenwolf e em uma versão mais jovem durante uma batalha. Com sorte, também poderemos ver a continuação da sequência de Knightmare que foi apresentada em Batman vs Superman e o Flash voltando no tempo para alertar Bruce Wayne.
Veremos também mais do Cyborg, da descoberta de seus poderes e da relação de Victor Stone com seus pais, assim como o seu jogo de futebol americano pela universidade de Gotham e seu acidente. Sabemos que o filme desenvolveria o herói dando um gancho para seu filme solo, logo há bastante material para ser exposto. Também veremos mais de Barry Allen e teremos a presença de Íris West – par romântico do herói que foi cortado na versão de cinema. Além disso, novos personagens estarão presentes: o Caçador de Marte, que Snyder revelou ser o General Swanwick (presente em Homem de Aço e Batman vs Superman), o Átomo, que foi divulgado em uma imagem publicada no Vero e, segundo rumores do set, Hal Jordan como Lanterna Verde – ou, pelo menos, outro Lanterna.
Por fim, teremos também mais desenvolvimento sobre Darkseid, a cena da Mulher-Maravilha decapitando o vilão, Steppenwolf e a tão prometida cena pós-créditos com o Deathstroke – diferente da que foi vista nos cinemas. Daremos adeus também ao cgi para remover o bigode de Henry Cavill, finalmente.
Outra alteração que será bem-vinda é a da trilha sonora. Por mais que a introdução com ‘Everybody Knows’ seja um dos pontos altos do filme, todo o resto da trilha composta por Danny Elfman foi horrível e não combinou com o tom do longa e dos personagens – com exceção da homenagem feita utilizando a trilha clássica do Superman, mas esta durou apenas dois segundos. Se o longa trouxer Hans Zimmer e Junkie XL novamente com a qualidade dos filmes antecessores de Snyder no DCEU, será perfeito.
Eu realmente espero que a nova versão de Liga da Justiça seja dividida em episódios para que haja maior desenvolvimento dos personagens – principalmente de Cyborg que foi tão prometido, mais cenas de ação, a conclusão da sequência do Knightmare, uma finalização decente do Steppenwolf e uma conclusão que ajude a conectar o longa aos futuros filmes do DCEU. Agora, é esperar 2021 para assistirmos a Zack Snyder’s Justice League no HBO MAX, após longos três anos de espera.
É inegável a importância que o movimento teve para a história do cinema, não só pelo amor dos fãs ao trabalho de Snyder junto com a sua não desistência para conquistar a versão do diretor, como também pelo fato de ter tido um final feliz. Um movimento que levantou tags em redes sociais, placas na frente dos estúdios da Warner Bros. e até mesmo cartazes pelas ruas conquistou o seu objetivo – finalmente veremos o Snyder Cut. O #ReleaseTheSnyderCutnão foi somente um movimento para os fãs poderem ver a versão do diretor, mas sim um movimento em favor à liberdade artística e contra a injustiça que o estúdio cometeu com Zack Snyder, se aproveitando de sua tragédia familiar para afastar o diretor e tentar lucrar mais com seu universo compartilhado repetindo a fórmula do vizinho.
Goste de Zack Snyder ou não, ele é um diretor que se entrega a cada projeto que faz e é nítida a ideia que o diretor tinha para o universo compartilhado da DC e o carinho que o mesmo dedicava aos filmes. Finalmente poderemos ver a conclusão da trilogia iniciada em 2013, com Homem de Aço, e honrar a memória de sua filha, Autumn Snyder.
O que torna uma personagem interessante? A resposta é conflito porque nós somos comovidos pelos atos grandiosos, mas por dilemas e a superação deles. Há quatro tipos de conflito na ficção: Indivíduo contra indivíduo, sociedade, natureza e ele mesmo. Apesar da não predominância de desafios externos, há diversos internos para Rey, a protagonista da última trilogia de Star Wars. Tais quais: A sensação de abandono, insegurança, a necessidade de aprovação, pertencimento e a busca por identidade. Logo, através deste longuíssimo artigo, nós discutiremos a jornada de Rey, de ninguém, à Palpatine e à Skywalker.
“A Força desperta…”
Você já se apaixonou por uma pessoa sem ver o rosto dela? Porque eu já.
A introdução de Rey é brilhante. Composta por quase nenhum diálogo, a contextualização do seu cotidiano é perfeita. Porque o entendimento é imediato: Ela é uma catadora sobrevivente solitária, ganhando um quarto de porção por dia. Apesar da solidão e tristeza, o tema composto por John Williams é ingênuo e pacífico. Os desejos da personagem são expostos visualmente, seja pelos números riscados em um AT-AT, ou a maneira como observa as naves que deixam Jakku. Entretanto, só será verbalizado quando ela é atraída para a aventura por BB8: “Eu sei tudo sobre espera. Pela minha família. Eles voltarão. Um dia.” A partir dessa fala, a esperança dela é compreendida por nós, mesmo com uma trágica realidade por trás.
Quando o planeta é deixado por ela em prol da missão, Rey ascende socialmente: Ela faz amizade com Finn, um stormtrooper desertor, e uma breve figura paterna é descoberta em Han Solo. Durante a cena do compressor, outra característica é exposta: A necessidade de aprovação, nesse caso, de Solo. Assim como um auto desprezo: “Eu sou apenas uma catadora.” Há também um senso de deslumbramento constante na personagem, não apenas quando avista um planeta repleto de verde, contrário ao seu planeta desértico. Assim como quando as histórias sobre a Força, os Jedi, os Sith e Luke Skywalker são confirmadas. Novas possibilidades estão abertas a ela, através da proposta de emprego por Han e a missão da busca pelo mapa. Conforme apresentado pelo filme, ela é extremamente habilidosa como catadora, piloto e até mesmo, mecânica. Por que ela não aceitaria a oferta?
Ela ama verde <3
Porque na filosofia de Rey, se, após a missão, ela não voltar para Jakku, não estará lá para o retorno de seus pais. Ao mesmo tempo em que o desejo é fruto de um otimismo, é um fator de um repulsão. Caso ela retorne, não crescerá como pessoa, ou descobrirá quem ela é. Através disso, a personagem será forçada ao afastamento de uma realidade anterior e lançada diretamente a uma nova. A protagonista é atraída pela própria voz, ao desconhecido. Quando ela é chamada pelo sabre de luz dos Skywalker, as visões mostram a ela um inevitável pedaço do seu passado: O seu abandono.
Mesmo com a explicação de Maz Kanata sobre a Força, Rey está assustada. Assim como toda jornada de herói, há a negação ao chamado à aventura. Todavia, a decisão não é apenas fruto da sua vontade. Maz diz: “Você já sabe a verdade. Quem quer que esteja esperando em Jakku, não retornará.” A partir desse momento, é compreendido a negação da personagem pela verdade, uma caraterística constante nos próximos filmes. A promessa foi uma mentira contada por ela mesma a fim do ocultamento traumático e as consequências disso. Por isso, a música da personagem é triste e ao mesmo tempo, feliz, a representação sonora do otimismo como instrumento de negação. Ou seja, Rey não acredita no próprio potencial.
Tristeza, apenas tristeza
Perdida, ela foge para a floresta, mas é capturada por Kylo Ren. Durante a cena de interrogação, ela é menosprezada pelo vilão: “Você. Uma catadora.” Assim como tem suas fraquezas reveladas por ele: “Você é tão solitária. Tem medo de sair […] e Han Solo, você o vê como o pai que nunca teve.” Kylo está certo de que ela não resistirá, assim como ocorrido com Poe no início do filme. Entretanto, a tortura mental é resistida e a Força é utilizada pela primeira vez por ela. Ela inesperadamente “devolve na mesma moeda”: “Você tem medo de que nunca será forte como o Darth Vader.”
A perseguição da Millenium Falcon em Jakku, mostra inicialmente, Rey sem noção de direção, mas no decorrer da cena, ela aprende como pilotar a nave até dominá-la. Logo, se o fácil aprendizado da personagem é perigoso, com a Força, será ainda mais. É o que acontece quando ela convence um stormtrooper a libertá-la através de um truque Jedi da mente. Ela não sabe se irá funcionar, mas o faz mesmo assim e obtém sucesso na terceira tentativa. Agora, livre, e com a noção de algo em seu interior, ela não é mais uma catadora, mas uma força a ser temida.
Kylo Ren comete um erro.
Como Kylo disse: “Ela está testando seus poderes. Quanto mais demorarmos para encontrá-la, mais poderosa ela se tornará.” Chame Rey de Mary Sue, eu não ligo, mas é honestamente incrível e empoderador, ver uma mulher escapando com seus próprios recursos porque ela é uma sobrevivente, enquanto os homens tentam resgatá-la, no caso de Finn e Han, ou sequestrá-la, no caso de Kylo. Mesmo com as habilidades utilizadas, ainda não há compreensão sobre elas.
Mais tarde, no segundo e último confronto em uma floresta, o sabre dos Skywalker é chamado por Kylo, mas só atende o chamado de Rey, ainda incerta, mas seguidora de um instinto. Ela o ataca, mas foge, assim como em Takadona, até ser levada à beira da morte, em que o inimigo declara a si mesmo como um professor. Os conselhos de Maz finalmente são seguidos por ela: Os olhos dela são fechados e a Força desperta nela por definitivo. A sensação de superioridade masculina do vilão cai por terra ao ser superado por uma simples catadora, a qual via-se da mesma forma há algumas horas, mas agora, com a sensação de que há muito mais a ela do que uma vida em um planeta deserto.
Kylo Ren comete um erro 2
A vitória é ainda maior quando Rey é enviada para Ahch-To, vê a ilha em seus sonhos e encontra Luke Skywalker. É um momento de extrema importância para o personagem: As lendas, as histórias tornam-se real e ela é parte delas agora. Não há mais uma realidade anterior para retornar. Como Maz disse: “O pertencimento que você busca não está atrás de você, mas à frente.” A resposta é assumida por Rey: “Luke.” Talvez ela esteja errada e o sucesso seja uma ilusão.
“… a última Jedi…”
Admita: A sua reação foi a mesma.
Quando ocorrem discussões sobre a trilogia sequela, costumo apontar que esses filmes são propositalmente metalinguísticos por serem uma análise da memória coletiva de Star Wars. Se O Despertar da Força é a afirmação da saga como um fenômeno, através de Rey, uma fã das histórias assistidas por nós, Os Últimos Jedi irá além e questionará essa admiração através de uma quebra das expectativas, a qual é comum com todas as personagens durante a narrativa, mas mais centralizadas na nossa protagonista, com um arco dramático simultâneo a outros dois personagens: Luke Skywalker e Kylo Ren.
Durante a primeira cena dela, há uma sensação de vitória e sucesso, um otimismo, mas o encontro com o velho Jedi é filmado de uma maneira diferente: É mais impessoal, com um distanciamento maior e até mesmo uma trilha sonora decrescente. Mesmo assim, a personagem não está preparada para a rejeição dele. É como se o sucesso de alguns minutos atrás, perdessem o significado. Entretanto, o seu fracasso, não apenas com ela mesma, mas com Leia e a Resistência, é negado. Ela persistirá e o seguirá, até cair de joelhos, cansada, decepcionada e confusa com o não cumprimento de expectativas.
Achou que seria fácil? Achou errado.
Novamente, a heroína é chamada ao desconhecido, dessa vez, até uma árvore com a incisão de luz sobre os textos Jedi, é possível a argumentação de que isso é a representação de seu futuro, já que eles são utilizados no nono filme. Luke finalmente aproxima-se e pergunta sobre o propósito dela. Uma motivação ideológica é dada: “A Resistência me enviou.” É como se uma adolescente tentasse esconder os seus sentimentos. Logo após, a motivação pessoal finalmente é admitida: “Algo dentro de mim, sempre esteve lá e agora despertou. E eu estou com medo. Eu não sei o que é e o que fazer com isso.” Logo, o maior desejo de Rey é um guia para a autodescoberta na Força.
Luke é apenas desenvolvido como um personagem por causa do passado e indiretamente, por causa de Rey. Apesar de ter concordado em ensiná-la (Depois de uma chantagem emocional do R2D2), há a necessidade da provação sobre o fim dos Jedi. Logo, duas lições relacionadas a esse ponto de vista são ensinadas para a personagem. Se pudesse descrever Rey em um adjetivo, provavelmente seria ingênua. De acordo com o dicionário: “Que possui inocência e simplicidade; que não possui malícia.”
Ensine a garota, Luke. Ensine-a agora.
Em decorrência disso, a visão de Rey em relação aos Jedi, à Força, são básicas e talvez, romantizadas. Durante a primeira lição, essa simplicidade é demonstrada quando é dito: “É um poder que ajuda os Jedi a controlarem mentes e fazer coisas flutuarem.” Algo o qual Luke imediatamente discorda devido aos seus anos de experiência. Não é sobre levantar pedras, a Força não é um super-poder e não pertence aos Jedi. Pela primeira vez, Rey está conectada ao seu interior espiritualmente, em paz e liberdade: A ilha, a vida, a morte, a luz, a escuridão, os ciclos dessas relações finalmente apresentados a ela. Mas ela é tentada pelo lado sombrio, ao não conter-se diante do desejo e necessidade. O passado ainda vive em seus pensamentos.
Enquanto a primeira foi sobre a democratização da Força, a segunda é sobre a desconstrução da romantização da Ordem Jedi. Luke os aponta como um legado de fracasso, mas há discordância por Rey: “A galáxia talvez precise de uma lenda” e o acréscimo de seu desejo: “Eu preciso de alguém que me mostre o meu lugar nisso tudo.” Ela até mesmo o lembra de Vader. Ironicamente, há uma crença absoluta na ideia de que Kylo é o culpado: “Kylo falhou com você. Eu não irei.” A sua necessidade de aprovação faz-se presente novamente e Luke, diferente de Han, está espantado com a determinação da jovem. Todavia, se uma há de conhecer a verdade, deve conhecer todos os aspectos sobre ela. O que leva ao outro lado do arco dramático compartilhado: Ren.
É um filme muito bonito.
De acordo com os sofistas, a verdade é um conceito relativo: O que é para um, pode não ser para outro. No roteiro por Rian Johnson, há duas verdades sobre o mesmo acontecimento: A de Luke, a de Kylo e a ouvinte, em conflito com uma resposta definitiva: Rey. Como os dois lados são necessários, a díade é criada com o propósito narrativo da desconstrução da simplicidade na mente dela e a construção de ambiguidade. Mesmo com ódio dela por ele, a inevitável conexão, a cada cena, os tornam mais íntimos.
Queira ou não, o vilão é o responsável pela mudança de visão de mundo da protagonista. Conforme dito pela atriz Daisy Ridley no documentário The Director and The Jedi: “Luke realmente deveria estar estimulando, mas é Kylo quem o faz.” Novamente, a necessidade de uma família em decorrência do seu abandono é apontado como uma fraqueza, apesar da negação dela. Além disso, há uma resistência em acreditar no ponto de vista dele sobre Luke. Na filosofia dele: “Deixe o passado morrer. Mate-o se for necessário. É a única forma de tornar-se quem você está destinada a ser.” (Ele está errado no final)
“É a primeira vez que eu vejo água e você me interrompe!”
“Beleza.”
Movida pela confusão e necessidade, Rey adentra ao desconhecido novamente, agora, em busca de respostas. Se a árvore era a representação de seu futuro, a caverna é o passado. Durante uma sequência psicodélica, com múltiplas versões suas enfileiradas, ela é chamada por uma voz feminina e levada até o espelho, até o fim, sem pânico, ou medo, como se ela esperasse por um destino. “Meus pais. Deixe-me vê-los.” – ela solicita, mas só lhe é concedida a própria reflexão. Ela precisa descobrir quem ela é, por ela mesma. Sem a compreensão disso, ela está devastada, sem respostas e tão sozinha quanto a sua infância em Jakku. Logo, em seu momento de desespero, a única possibilidade de confissão é com o “monstro”.
Como descrito por Johnson no áudio-comentário do filme quando Ben e ela tocam as mãos: “A noção de que ela vê essa oportunidade nele e talvez, algo além disso.” A partir desse momento, a segunda verdade é finalmente revelada a ela e confrontada contra Luke. Se antes havia ódio pelo aprendiz de Snoke, agora há a compaixão, mas ela ainda precisa da verdade. Neste momento, quando ele nega-se a aceitar o sabre novamente, é perceptível a ela: Se Luke não é a esperança da Resistência, talvez Ben seja. Um Skywalker de sangue por outro. Ela é novamente guiada por esperança, assim como quando chegou na ilha e o último Jedi é deixado com uma lição a ser refletida: Não é tarde demais para ele.
Pega logo isso, Luke. O braço dela está doendo.
Apesar do perigo, da incerteza, ao dirigir-se até uma armadilha, os ideais de Rey são prevalecentes, assim como suas expectativas devido ao seu coração otimista e a visão do futuro dele: “Ben, quando nós tocamos mãos, eu vi o seu futuro. Apenas uma parte dele, mas sólido e claro. Você não ajoelhará-se perante ao Snoke. Você mudará. Eu o ajudarei.” Entretanto, a crença dele é contrária, devido às respostas possuídas sobre os pais dela. Rey imediatamente recua quando ele diz: “Eu vi quem são seus pais”, pela resolução ter sido negada por ela. Através disso, há uma obviedade não dita sobre o término dessa sequência.
A expectativa dela sobre a redenção dele é fortalecida quando Snoke é morto e os dois unem-se contra inimigos. Após o final da violenta e enérgica colaboração, a preocupação imediata dela é com os resistentes. A fim de manipulá-la emocionalmente, Rey é forçada por Kylo a revelar a “verdade” negada por ela sobre os pais dela: “Eles eram ninguém.” O trauma do abandono e a quebra da ilusão de uma predestinação, ou de um lugar nesta história. Ela é menosprezada novamente por ele, dessa vez, não chamada de catadora, e sim, nada. Aliás, também há decepção com a escolha dele.
“Um novo império? Ben, meu compromisso é com a frota, é com a Resistência.”
Pela primeira vez no filme, Rey não estende a mão esperando que alguém a pegue. As suas vulnerabilidades não são interferentes aos seus ideais, os quais permanecem mesmos durante o todo filme, enquanto os de Luke e Kylo, indiretamente influenciados por ela, são invertidos e enquanto eles lutam contra os seus demônios, as pedras são levitadas por ela em Crait e a sua visão ingênua é afirmada não como um equívoco, ou uma fraqueza, mas como o caminho certo.
Se antes a crença era de que eles eram a esperança, agora é finalmente descoberto: Rey é a esperança e o pertencimento realmente não estava atrás, mas à frente: Em Finn, Poe, BB8, Rose, Chewie, a Resistência e principalmente, Leia, a única personagem que pega a mão dela como um guia para um futuro mais brilhante e esperançoso: “Nós temos tudo o que precisamos.” – a general diz para a garota segurando o sabre partido em duas metades, Mas de alguma forma, Palpatine retornou.
“… para ascender como uma Skywalker.”
Apesar dos motivos errados para um retcon relacionado à linhagem (Ela é poderosa por causa dele, ur dur), a personagem da Rey não foi arruinada, ou profanada, ou destruída em A Ascensão Skywalker. Muito pelo contrário. Visto que os desafios internos ainda estão ligados ao seu cerne: Família, o medo da solidão e o encontro do coletivo e principalmente, a busca por identidade. Além disso, é a melhor performance da Daisy Ridley no papel e é impressionante como a linguagem corporal é uma excelente transmissora da evolução da nossa heroína.
Se antes era tão incerta sobre a levitação de pedras, agora é uma tarefa fácil. Rey é reintroduzida conforme foi vista pela última vez: Com tudo o que ela precisa. O pertencimento foi encontrado na Resistência, tal qual uma figura materna/mestre: Leia. A zona de conforto foi encontrada pela personagem, ela finalmente está perto de conseguir tudo o que mais desejava. Entretanto, dentro de uma história, conforto nunca é duradouro para uma protagonista. Logo, conflito é necessário e as questões internas devem vir à tona.
Ela precisa de um abraço. Eu também.
Através da cena do treinamento, a base dramática perfeita é solidificada por três emoções. Primeiro, a insegurança, presente quando ela acredita que é impossível comunicar-se com as vozes dos antigos Jedi. Segundo, o medo, proveniente de visões sobre um futuro sombrio e eventos traumáticos do passado. Terceiro, a sua raiva, enquanto ela destrói o droid de treinamento, ela também deixa uma árvore cair em BB8. Pode parecer bobo, mas é eficiente para a construção de que Rey não é apenas um perigo para a Primeira Ordem, mas para os amados por ela também.
A necessidade de aprovação também é um elemento compartilhado com os dois filmes: Se no VII, era Han, no VIII, Luke, agora, no IX é Leia, quando é dito por ela: “Eu não quero ir sem a sua benção, mas eu irei. É o que você faria.” Não apenas isso, há indícios do retorno de um auto desprezo por conta do fracasso como por exemplo quando ainda é sentida a necessidade de merecimento sobre o sabre Skywalker, mesmo que o objeto tenha chamado por ela há muito tempo. É importante lembrar que ela também é assumidora do papel o qual seria desempenhado por Luke: A esperança de uma rebelião. Logo, é totalmente coerente a vontade dela em finalizar a jornada do Mestre Jedi para encontrar Exegol sozinha, para não deixar os amigos dela saírem feridos.
“The Sacred Jedi Texts!”
Contudo, A Ascensão Skywalker é um filme sobre coletividade e eles escolhem acompanhá-la na missão. Cabe ressaltar que o trio é a melhor decisão tomada em relação à história e as interações entre ela, Poe e Finn são muito bem escritas. Antes de deixarem Aj Kloss, Leia, ciente das inseguranças da sua aprendiz e das suas reais origens, aconselha: “Rey, nunca tenha medo de quem você é.” Algo não compreendido pela Jedi inicialmente.
Quando é testemunhado por ela o festival de Aki Aki, é afirmado: “Eu nunca vi nada como isso.” Mesmo estando um ano fora de seu planeta, esses momentos simples ainda são encantadores para Rey. No primeiro filme, foi Takodana, com uma paisagem esverdeada. Em Os Últimos Jedi, gotas de chuva e aqui, uma celebração. Ainda durante essa cena, há um set up importantíssimo para o final da história. É questionado a ela o seu nome e após isso, o nome da sua família. É tão sútil como a trilha por Williams e a atuação de Ridley são novamente transmissores de um otimismo como esconderijo de uma tristeza. “Eu não tenho um. Sou apenas a Rey.” – é respondido por ela com um sorriso forçado. Ela não se sente ela mesma.
“Ok, Rey, como você disfarça tristeza na frente de uma senhora?”
Como mencionado anteriormente, raiva é uma das três principais emoções a serem lidadas por ela nesse filme. No fim de Os Últimos Jedi, os destinos de Rey e Kylo Ren divergem completamente. Enquanto ela olha para o futuro, ele continua estagnado, falhando em matar o passado. As consequências emocionais desse ato de separação são transmitidas pela raiva dela. Sob um certo ponto de vista, a ideia de trazer o capacete de volta, é uma metáfora visual mais eficiente às sensações da protagonista do que as do antagonista. Porque é uma retomada da ideia inicial dela por ele: Um monstro. Tal qual visto em suas visões, a maligna proposta de Kylo ainda está viva na mente dela, tal qual o trauma do abandono.
No documentário The Skywalker Legacy, Chris Terrio diz: “E se a sua alma gêmea na Força fosse o seu inimigo? Circunstâncias o colocam um contra o outro, mas a Força os une. Eles entendem um ao outro sob o ponto de vista e mesmo assim, destino os fez inimigos.” Ao mesmo tempo em que ela é atraída pela conexão, no instante em que avista a nave dele, ela imediatamente o ataca. É importante lembrar que ela é pressionada por ele ao lado sombrio, para descobrir a verdade sobre ela mesma, ou pelo menos, aquilo a verdade dele sobre ela. Quando é informada de que Chewie está dentro de um dos transportes, ela imediatamente tenta puxá-lo, mas Ren opõe-se a ela e a competição torna-se tragédia, quando raiva é materializada através de um raio.
“Poder! Poder ilimitado!”
Mesmo que não tenha sido exatamente a responsável por isso, como o seu melhor amigo Finn aponta, ela culpa a si mesma. Ela comenta sobre as visões do trono do Sith em que ela está sentada ao lado do Líder Supremo. Apesar de não ser exposto no filme, é interessante como ela desesperadamente ansiava por um destino, mas aceitou o fato de não possuir um. Agora, o desejo anterior é realizado, mas parcialmente. Porque não há uma grandeza positiva como resultado final, apenas uma negativa. Ela está destinada para o mal, mas ainda não sabe o porquê, ou de onde ela veio.
Assim como o passado não está quite com a galáxia, também não está com Rey. Durante a missão, a nave procurada por ela é a mesma em que seus pais partiram e algo horrível foi feito com o uso da adaga Sith. Entretanto, esses objetos serão re-significados: O primeiro, o lugar em que eles morreram e o segundo, como eles morreram. Ela já descobriu, mas a negação sobre o passado, tornará a admissão mais difícil. Novamente, ela será pressionada a enxergar as coisas como são: Os pais delas foram assassinados e ela é uma Palpatine de sangue.
Eu amo braços.
Durante toda a sua vida, Rey mentiu para ela mesma sobre ter sido abandonada, mas sempre sentiu que foi. Agora, a descoberta de que ela não foi deixada como lixo, mas protegida e todo o amor o qual poderia ter recebido, foi tomado dela pelo próprio avô, pelo próprio sangue. Conforme visto nos episódios anteriores, família sempre foi a vulnerabilidade dela. Logo, a reação dela , a essa retirada de seu desejo, a torna irreconhecível: “Ele matou meu pai e minha mãe. Eu encontrarei Palpatine e o destruirei.” Pela primeira vez, o lado pessoal da heroína fala muito mais do que o ideológico. É tudo sobre vingança agora, mas não é perceptível a ela. Se ela não fizer isso sozinha, os amigos dela sairão machucados.
Em Kef Bir, Rey separa-se do grupo. Nem mesmo a maré alta a impede de adentrar na Estrela Morte. A personagem parece ter regressado aos seu estágio inicial: Sozinha, escalando escombros imperiais. A heroína é chamada ao desconhecido novamente. Antes, pelo o sabre dos Skywalker, agora, o localizador Sith. A personagem já foi de encontro à escuridão em Ahch-To (Há espelhos também), mas não amedrontada como agora, com a materialização da sua visão sombria: A Imperadora Palpatine, a qual compartilha das palavras de Leia: “Não tenha medo de quem você é.” É isso quem ela é?
Eu amo paralelos.
Não obstante, ela é ainda mais pressionada por Kylo: “Olhe para você. Queria provar à minha mãe que era uma Jedi, mas acabou provando outra coisa.” O discurso dele não é interessante à Rey, o localizador nas mãos dele sim e ele tira isso dela. Ela é consumida pela raiva absoluta e um duelo é iniciado. Rey está cada vez mais distante de quem ela é. A cada golpe contra Kylo, há raiva, fúria e talvez ódio por todos os atos dele contra ela. É interessante como o cansaço dela é visível à medida que a batalha torna-se mais intensa e os movimentos, mais lentos e desordenados. Pela primeira vez, derrota parece próxima.
Mas a interferência de Leia não apenas a salva, como também o faz com Ben. Infelizmente, não é perceptível a ela o ato de sua mentora e no momento mais crítico e sombrio, Rey esfaqueia o seu nêmesis. É como se Leia fosse assassinada pela própria aprendiz e nesse momento a verdade recai: Ela tornou-se o que ela nunca foi. Arrependida, ela cura aquele que provocou muita dor a ela, porque ela é compassiva. Ironicamente, o ato é remetente a uma cena anterior do filme, em que uma serpente ferida é curada por ela. Ainda mais irônico, é o fato dela ter chamado o neto de Vader de “cobra assassina” em Os Últimos Jedi.
A sorte dele é que ela é uma garota bacana.
Após um momento de puro instinto como uma sombra, Rey exila-se em Ahch-To. Alguns disseram que Episódio IX não é uma sequência do anterior, mas esta cena prova ao contrário. Porque há um lindo complemento na relação entre ela e Luke. Se no filme anterior, os atos dela são inspiradores para uma auto reflexão sobre os medos dele, agora ele fará o mesmo por ela. É como poesia, rima. Yoda disse: “Ben Solo você perdeu. Perder Rey não devemos.” Ele finalmente torna-se o que ela esperava dele: Um mentor.
“Passe a ela tudo o que você aprendeu […] o maior professor o fracasso é.” Ambos já estiveram no mesmo lugar por medo, mas do que Rey tem medo? Dela mesma, da escuridão dentro dela, de como pessoas ao redor dela estão em risco, mas principalmente por ser uma Palpatine, uma herdeira do mal definitivo. Entretanto, o espírito, o coração, é o que Leia viu nela. Durante a vida dele, Luke viu o sobrinho com o sangue Skywalker ir para o lado sombrio. Logo, resta apenas uma lição, a mais importante para a decisão da heroína no final: “Algumas coisas são mais fortes do que sangue.”
Eu chorei muito.
Se Rey não se considerava merecedora do sabre a ponto de até mesmo jogá-lo longe (tal qual Luke), agora, o sabre de Leia também será concedido a ela e a jornada dela para se tornar uma Jedi será finalizada ao lado dos seus mestres, metaforicamente. A missão é obviamente aceita porque ela jamais mediu esforços para ajudar os outros. Agora, o futuro dos Jedi, não como uma ordem, mas como um conceito de heroísmo, está em suas mãos. Quando chegou à ilha, estava dentro de um caça Tie, ao deixá-la, pilota um X-Wing, um dos seus sonhos de infância. A mensagem é clara: A pureza é a vencedora. Não é mais sobre vingança, é sobre confrontar o medo.
Não há mais volta quando o trono dos Sith está à sua frente. O objeto de sua visão é real, assim como o homem responsável por todas as desgraças ocorridas em sua vida, mas não há mais chances de ser tentada ao lado sombrio porque ela já ressurgiu das suas inseguranças e erros. “Tudo o que você quer é que eu odeie, mas eu não irei. Nem mesmo você.” Apesar de Palpatine tentar usar o trauma contra ela, ele não consegue porque já foi usado contra ela tantas vezes. Só resta finalmente a consideração pelo sacrifício dos que a geraram: “Meus pais eram fortes. Eles me salvaram de você.”
Isso, garota!
Assim como Snoke subestimou Kylo, o Imperador subestima Rey ao acreditar que ela abraçará a linhagem sanguínea. Entretanto, ele desconhece o verdadeiro poder dela: Os seus simples atos de bondade. Graças a eles, os seus desejos e expectativas do último filme são validadas no ato final: Não apenas Luke serve como uma guia, mas Ben Solo retorna à luz para salvá-la. As vozes do Jedi são finalmente ouvidas por Rey e nada mais parece impossível.
É a carta de amor à coletividade. Se ela era solitária, agora há a descoberta de que ela nunca esteve sozinha, na Força. Porque eles ouvem o chamado dela por ajuda. Estes são os últimos passos para tornar-se uma Jedi. Os dois sabres Skywalker são empunhados por ela e com a ajuda daqueles que vieram antes, ela deflete os raios do seu avô contra ele mesmo, contra o ódio dele. É defesa, não ataque, como uma verdadeira Jedi.
Ela é todos os Jedi, otário.
Quando Rey morre aliviada por ter salvado os seus amigos e é ressuscitada por Ben, é um ato de retribuição. Se analisarmos, Episódio IX é também sobre como a compaixão de Rey movimenta a história e outros personagens: Ela cura uma serpente e isto inspira BB-8 a religar D-O. Porque Rey oferece a ele conforto, ele encontra algo em comum com Finn: Saudades dela. Por causa disso, o droid ajuda a Resistência com informações sobre a frota. Quando Kylo é curado por Rey, ele não entende o porquê. Entretanto, na última cena entre os dois, ele finalmente entende o que ele deve fazer e tem a força para fazer: Uma vida por outra. A conclusão da díade é através do ciclo de vida e morte. Gentileza gera gentileza.
É irônico e satisfatório ver a queda do último Destroyer da frota de Palpatine cair em Jakku. Porque ele é a razão para ela ter vivido toda a infância e adolescência dela naquele lugar, mas ele será esquecido como areia no deserto. Enquanto isso, Rey reencontra-se com a família dela: Finn , Poe, a Resistência. Ela essencialmente sempre volta para casa. Contudo, ainda resta algo importante. Durante a trilogia, Rey é chamada por tantos nomes: Catadora, a garota, nada e Palpatine. Kylo Ren e o Imperador assumem conhecê-la, a sua verdadeira natureza. Entretanto, como dito por ela: “Ninguém me conhece.” Não é sobre a aceitação do que é dito para ela, mas como ela sente-se sobre ela mesma.
Ela foi chamada pelo sabre Skywalker, mas sempre tentou retorná-los aos mestres dela devido à insegurança, apesar de merecê-lo. No início do filme, ela diz: “Eu serei digna do sabre do seu irmão. Um dia.” No fim, ela é digna do sobrenome. Ela escolhe o sabre de luz dela, composto por parte dos bastões dela, dourado, brilhante como ela.
Ela faz o destino dela.
Assim como os seus pais escolheram serem ninguém, ela também escolhe a identidade dela, com a permissão de Luke e Leia : “Rey Skywalker.” – ela diz confiante. Se antes olhava para naves esperando pela volta dos seus pais, agora, ela olha para o nascer dos dois sóis, uma imagem icônica da saga, tão alta quanto eles, para o futuro. Porque o pertencimento buscado realmente estava à frente dela.
Produzido pelos diretos de Vingadores: Guerra Infinita e Vingadores: Ultimato, Joe Russo e Anthony Russo, Resgate estreou na Netflix nesta sexta-feira (24/04). O longa de ação é estrelado por Chris Hemsworth e apresenta uma trama bem simples e comum, o que levanta a seguinte questão: será que Resgate é mais um filme clichê do gênero?
Em Resgate, acompanhamos Tyler (Chris Hemsworth), um mercenário que aceita a missão de resgatar o filho de um traficante indiano, que foi sequestrado pelo seu maior rival. No decorrer do longa, há diversas situações e obstáculos e ele vai precisar lidar com eles da melhor maneira possível para garantir a segurança do garoto.
A trama é bem simples e direta ao ponto, sem dar profundidade aos personagens e nem aos dramas pessoais de Tyler – que são brevemente mencionados em flashbacks. Por conta disso, as cenas de ação se tornam o principal atrativo do longa.
O filme é dirigido por Sam Hargrave, dublê e coordenador dos dublês nos últimos dois filmes da franquia Vingadores, logo é de se esperar boas cenas de ação no decorrer do longa. De fato as sequências de ação não decepcionam, as cenas de luta apresentam coreografias excelentes e as cenas de perseguição são de tirar o fôlego – isso tudo apresentando uma boa edição. Durante todo o momento, a câmera segue o personagem de Hemsworth como se fosse em um videogame e sem cortes bruscos, o que faz com que as cenas fiquem bem mais dinâmicas.
Bom, a fotografia do longa cai no clichê do gênero ao apresentar um filtro amarelado com o intuito de representar a localidade que o filme se passa – a capital de Bangadlesh. Geralmente, as produções norte-americanas utilizam esse filtro para lugares nos quais são considerados de ‘terceiro mundo’ e um exemplo disso são as cenas no México em Breaking Bad ou em filmes que se passam na África. A saturação amarela do ambiente incomoda bastante em algumas partes do longa.
Quanto ao elenco, apenas Chris Hemsworth se destaca. Sua atuação é relativamente a mesma feita em todo o filme de ação que o mesmo já estreou: o estereótipo do soldado/mercenário durão que consegue fazer qualquer coisa. O resto do elenco serve apenas para conduzir a trama, sem grandes destaques – até mesmo David Harbour passou batido.
Por fim, e respondendo a pergunta feita na introdução da crítica, Resgate foge um pouco do clichê presente no gênero de Ação ao mostrar cenas de ação dinâminas e bem feitas, sem o uso da ‘câmera tremida’ e sem cortes bruscos. Porém, a fotografia, a situação da trama e o desenvolvimento do protagonista caem no clichê. No geral, é um filme divertido de se assistir pelas cenas de ação, e só.
Nota: 3/5
A difícil missão deste mercenário vira uma transformadora luta pela vida quando ele é enviado a Bangladesh para resgatar o filho sequestrado de um chefão do crime.
Estrelado por Robbie Amell e Stephen Amell – atores conhecidos por seus papéis em Flash e Arrow, respectivamente – e baseado no curta de mesmo nome, Code 8 – Renegados chegou na Netflix semana passada (sábado, 11/04) e foi realizado graças a uma campanha realizada pelos atores que resultou num financiamento coletivo de aproximadamente 2 milhões de dólares.
No longa somos apresentados a um universo – criado por Chris Pare e por Jeff Chan – onde 4% da população possui poderes e que são temidos pela sociedade, algo bem semelhante com o que é visto em X-Men. Entretanto, aqui os ‘mutantes’ são obrigados a viver no submundo devido ao preconceito da sociedade e são monitorados a todo o tempo por drones, além de serem classificados de acordo com seus poderes.
Na trama do filme acompanhamos Connor (personagem vivido por Robbie Amell), que cresceu escondendo os seus poderes por conta do passado de seu pai e que precisa cuidar de sua mãe doente. Sem conseguir um emprego decente, ele trabalha ilegalmente utilizando seus poderes em construções até que um dia ele se cruza com Garrett (interpretado por Stephen Amell), um traficante de drogas feitas a partir do líquido cefalorraquidiano das pessoas com poderes. Com isso, Connor entra na jogada e precisa de um plano quando as coisas fogem do controle.
O grande problema no filme – além do ”baixo orçamento” – é justamente o roteiro. Por mais que a trama seja algo clichê e fácil de ser dirigido em um longa, ela é tratada de forma bem rápida fazendo com que não haja o correto desenvolvimento dos personagens envolvidos e nem do universo pré-estabelecido. As informações são simplesmente jogadas na tela e ficam a mercê do curto tempo de longa-metragem.
Com exceção desse problema o longa tem uma premissa excelente e mistura elementos já vistos em outros filmes como Push (2009, dir: Paul McGuigan) e Chronicle (2012, dir: Josh Trank), além da clara inspiração em X-Men. A construção é essencialmente a mesma, pessoas com poderes vivendo em um submundo e descobrindo seus talentos por conta própria. Tecnicamente falando, o filme é uma mistura de diversos elementos vistos em outros filmes dos gêneros de sci-fi, thriller e ação – elementos estes que funcionam em tela, porém que, pelo problema de roteiro citado acima, não são aproveitados como devia pela direção do filme.
A atuação do elenco também deixa bastante a desejar, tanto Stephen como Robbie Amell apresentam a mesma expressão a todo momento e a mesma atuação vista nas séries da CW. O restante do elenco sofre do mesmo problema, sendo apagados pelos dois astros.
Code 8 – Renegados não é um filme ruim, mas não chega a ser algo inovador nem acima da média. É um filme mediano com uma excelente premissa porém com um péssimo desenvolvimento de roteiro, mas que garante a diversão dos telespectadores e que, quem sabe, ensine o próximo filme do gênero que deseje ter esses elementos a não cometer os mesmos erros.
Nota: 2.5/5
Code 8 – Renegados apresenta um mundo onde pessoas com habilidades “especiais” vivem na pobreza. Conner Reed (Robbie Amell) é um jovem poderoso que está lutando para pagar pelo tratamento médico de sua mãe doente. Para ganhar dinheiro, ele se junta a um mundo criminoso e lucrativo, liderado por Garrett (Stephen Amell), que trabalha para um traficante de drogas.
Em 14 de abril de 1912, o mundo tinha presenciado o trágico naufrágio do RMS Titanic em sua viagem inaugural de Southampton, na Inglaterra, à cidade de Nova York ao se colidir com um iceberg no norte do Atlântico, afundando partes do casco do estibordo por uma extensão de quase 100 metros e expondo à água do mar os seis compartimentos dianteiros à prova d’água. Era completamente inevitável. O total de mortos chegou a 1.500 com este desastre marítimo, contando com tripulantes e passageiros.
Foi apenas em 1985 (73 anos depois) que os destroços foram encontrados no fundo do mar pelo oceanógrafo Robert Ballard junto com o cientista francês Jean-Louis Michel. O Titanic repousava aproximadamente 612 quilômetros a sudeste de Newfoundland em águas internacionais. A partir disto, inúmeras expedições foram realizadas ao longo dos anos para detalhar com precisão o estado da icônica fragata após um bom período naufragado. Mas havia um grande porém, retirá-lo do oceano demandaria um esforço descomunal. Por conta disso, permanecerá descansando sem problemas.
Cem anos após o naufrágio, a UNESCO passou a proteger o navio por causa de seu caráter histórico, arqueológico e cultural. Vale menção que está em processo de corrosão como moluscos devorando a maior parte da madeira do navio, ao passo que micróbios corroeram o metal exposto, criando formações de ferrugem semelhantes a estalactites.
Boa parte das pessoas podem ter tido acesso mais detalhado sobre a tragédia através de relatos em documentários e entrevistas, porém foi através da obra cinematográfica de James Cameron, que aconteceu a maior comoção em relação a história. E como ele conseguiu tal feito? Simples. Apenas trouxe um dos conceitos mais elementares no universo cinematográfico: o amor. Acrescente isto a uma trama inserida antes, durante e após ao desastre, e pronto. Essa é a fórmula de sucesso. Nas mãos certas, essa fórmula será lembrada depois de anos após o seu lançamento. James pode se gabar deste feito. Titanic é lembrado até hoje.
A história de amor arrebatadora entre Jack Dawson (Leonardo DiCaprio) e Rose DeWitt Bukater (Kate Winslet) conseguiu conquistar bem o seu público pela forma como foi retratada e claro, pela excelente química entre os atores. Desde o salvamento de Rose no início até a despedida de Jack já falecido na água no final foi tudo construído organicamente e você sentiu isso na primeira vez assistindo e sente novamente ao rever (sim, eu sei que na primeira oportunidade você está reassistindo). Se conecta com estes dois personagens. Isso é muito importante.
O conceito do amor proibido não é novo, porém aqui conseguimos ser envolvidos completamente. Torcíamos pelo casal, mas o destino não os queria juntos. Finais imprevisíveis sempre são vistos com desaprovação para os devoradores de filmes, pois vai contra ao nosso conceito de final feliz. Não é justo uma separação tão dura assim, não é mesmo? Nunca é, mas aprendemos que nem sempre as coisas são como devem ser. Precisamos lidar com isso. Quando a decisão de matar Jack vem, é um ato corajoso e muito realista. Algo precisava respingar para os protagonistas mesmo tendo passado por cada situação difícil após a colisão com o iceberg.
Apesar de algumas liberdades criativas para compor o filme como, por exemplo, a verdadeira Rose (o diretor leu a biografia de Beatrice Wood para compor a personagem), a história injusta do oficial William Murdoch ao mostrá-lo cometendo atos anti-éticos (sendo que na realidade, ele não cometeu nada disso) e o exuberante diamante azul que Rose ganha de presente é fictício, Cameron tentou ser o mais realista possível em vários aspectos. Como a dimensão da réplica do navio em quase 100% ao original, toda a trajetória de embarque até o naufrágio, personagens reais e até a melancólica canção tocada pelo grupo de homens que serviu como pano de fundo para todo o desespero dos passageiros no avanço das águas gélidas do oceano. A música católica Nearer, My God, to Thee ficou conhecida como a última tocada pela banda.
Os bastidores não deixam mentir todo o esforço da equipe interna, elenco e figurantes na composição das principais cenas para encenar as consequências da colisão do iceberg e todo esta mega operação rendeu excelentes frutos no ano seguinte. Indicado a 14 Oscar, Titanic garimpou a edição de 1998 com um total de 11 estatuetas. Um importante feito para esta obra-prima de Cameron. O conjunto da obra permite-me chegar nesta conclusão. Não foi somente este reconhecimento que alavancou o filme como um dos melhores de todos os tempos. Conseguiu alcançar mais de 1 bilhão mundialmente e entrou na lista das maiores bilheterias de todos os tempos em primeiro lugar. Permaneceu invicto até a chegada de Avatar e com isso, mostrou uma nova versatilidade do diretor em fazer cinema.
Titanic me conquistou na infância e toda vez que revejo, volto a sentir esse misto de emoções que me permitiram amar completamente a história. Ficar feliz com o romance e depois ir às lágrimas com o desfecho do casal. Sentir arrepios com o efeito cascata da colisão no iceberg. Ficar impressionado com a grandiosidade que James Cameron impôs com tanto cuidado e carinho. Titanic é uma obra para apreciar em qualquer época desta geração e das seguintes.
A obra cinematográfica existe por inúmeras influências. Sua existência e qualidade dependem da equipe criativa e técnica envolvida, da construção de seu argumento ao corte final na pós-produção. Esse desenvolvimento, que costuma levar muitos meses para ser concluído, precisa ser minucioso para construir um filme que seja reconhecido por seus espectadores. Contudo, a partir do momento em que há o lançamento em cinemas ou serviços de streaming, a obra é, necessariamente, apenas daqueles que a fizeram? Ou o seu público também exerce uma função fundamental na construção dessa história?
Difícil relacionar a qualidade de um filme a seus espectadores. Obviamente que a responsabilidade de se criar um bom conteúdo e, consequentemente, apresentar uma história, está nas mãos de seus idealizadores. Isto posto, quando chega na época de sua exibição, o filme passa por olhares distintos em públicos diferentes entre si. A crítica, as análises e as discussões assumem um papel de valor ímpar para com a concepção da obra no mercado cinematográfico. Quando a obra é exibida, ela se torna de todos, inteiramente influenciada pelos universos individuais, e pode acabar sendo reconhecida, ou depreciada, em poucos dias.
Violência Gratuita retrata o sequestro de uma família em uma região afastada, mas elitizada, da Áustria. Dois garotos vestidos de branco começam a torturar de maneira física e psicológica os familiares constituídos por um pai, uma mãe e seu filho, ainda criança – não podendo se esquecer do cachorro. Se o filme começa com uma trilha sonora clássica, se remetendo e construindo um clima serene e leve, a aparição do título do filme e a troca da música tranquila para outra absolutamente caótica e perturbadora transmite violência. E essa brincadeira com as trilhas remete a construção inteira da história, que aborda uma mistura sensorial inquietante.
Os agressores apresentam postura firme e segura, mas também de extrema educação e tranquilidade. Suas performances não condizem com o nível praticado por suas ações, já que, enquanto há cenas que explicitam a violência, a naturalidade de ambos só reflete a perversidade de seus psicológicos. Suas vestimentas, completamente brancas, se mostram uma escolha acertada do figurino, porque a cor de forma alguma reflete as intenções de seus personagens.
Enquanto a obra vai se desenrolando, e a trama ganha mais consistência, muito mais por sua ambientação, que oprime seus personagens em momentos de abuso e pressão psicológica, do que pelo roteiro, há um sentimento de incômodo crescente para com a situação. De forma alguma o roteiro é ruim ou medíocre, mas as intenções do filme dependem muito mais da forma como Michael Haneke desenvolve a narrativa e articula a fotografia. Exemplos disso: a insistência de manter quase o filme todo em um só cenário; a iluminação do cômodo que reflete certa melancolia; e o excesso de branco na constituição das cenas. O título brasileiro é muito preciso, a violência realmente é gratuita, e chegamos em determinada parte nos perguntando: qual a razão disso? Assistir a uma família sendo torturada? E a resposta é direta e aterradora: SIM.
Há a quebra da quarta parede em momentos pontuais do filme, onde o principal torturador conversa com a audiência, ou simplesmente dá um olhar – chega na alma -, mais significativo do que qualquer palavra proferida. Nessas passagens, entendemos que constituímos parte fundamental da narrativa da história. Não somos simples espectadores, somos cúmplices das escolhas criativas dos idealizadores.
Voltando ao começo do texto, o papel do público está totalmente ligado à obra. E Violência Gratuita representa essa ligação, mesmo que seja apenas uma expressão inconsciente. Nós precisamos ver o desfecho do filme, temos a necessidade de descobrir as conclusões reais da história, seja a morte inteira da família, ou sua salvação. Enquanto o desfecho não chega, ficamos atentos nas mais inescrupulosas ações dos agressores, e certas posturas do espectador podem traduzir valores morais e éticos.
Atualmente, vimos essa discussão ressurgir com a exibição de Coringa (2019), onde muitos alertaram sobre as posturas variadas do público para com as atitudes do personagem. Risadas com as cenas do anão tentando abrir a porta após um assassinato visceral cometido por Arthur, aplausos ao final enquanto o personagem anda pelo corredor com pegadas de sangue, provando sua inescrupulosa atitude etc. Nesse sentido, você não é culpado de ter algumas emoções contraditórias durante o filme, e, às vezes, o diretor está querendo que você as sinta. Porque o melhor do cinema é você se redescobrir e discutir seus próprios valores, olhando de forma ampla e abrangente como se dá o seu relacionamento com a sociedade contemporânea. Embora alguns confundam entretenimento com vazio intelectual e cultural, este produto entrega panoramas que evidenciam questões éticas e morais pertinentes.
Violência Gratuita, portanto, é uma experiência brutal e rígida, mas de importância incontestável. No cinema, estamos em um jogo onde aceitamos as condições impostas por roteiristas, diretores e artistas em geral, nos sentindo reféns das escolhas artísticas e de como elas reverberam na sociedade. A obra de Haneke não é só sobre liberdade criativa, mas como o público precisa assumir uma postura crítica para com o que está assistindo, amadurecendo o olhar e estabelecendo relações com sua própria realidade, julgando-a constantemente.