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O canibalismo falho de Raw

Escrito por Daniel Estorari

Canibalismo é algo que sempre me surpreendeu; chamando a minha atenção nos seres humanos mais ”selvagens” e escrupulosos; afinal, sempre tive o interesse de saber o que leva uma pessoa a chegar em um extremo tão grande a ponto de devorar um outro ser de sua mesma espécie. Como motivo de atiçar a minha curiosidade e aprender um pouco mais sobre esse ”universo obscuro”, um amigo me recomendou o filme francês Grave, que ficou conhecido como Raw no resto do mundo. Para ele, foi uma experiência chocante e angustiante, mas infelizmente, não posso dizer o mesmo.

Na história, a jovem vegetariana Justine acaba de ingressar na faculdade de Veterinária. Ao chegar no local, a garota é recebida pela irmã e veterana Alexia e pelo calouro Adrien, que acaba formando um forte laço de amizade com a moça. Em uma sequência de trotes não muito agradáveis, a protagonista da película acaba sendo forçada a comer um rim de coelho, que desencadeia uma fome insaciável por carne, e mais tarde, por carne de seres humanos.

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O filme é o primeiro trabalho reconhecido da diretora Julia Ducournau, que consegue entregar um drama razoavelmente bom para quem está assistindo. Mas o mesmo não pode-se dizer sobre as suas cenas ”chocantes”, que apesar de perceptível o esforço que a francesa tem em transmitir sequências desconfortáveis, Ducournau não consegue fazer com que o seu espectador sinta qualquer ”dor no estômago”. Bem, isso pode variar de pessoa para pessoa, mas das dez cenas ”surpreendentes”, apenas duas conseguem fazer um trabalho áspero.

O elemento principal demora para aparecer, causando cansaço e desânimo, dando vontade de parar o filme em seus primeiros trinta minutos. Porém, quando o canibalismo dá as caras, a antropofagia empurra a sensação de incômodo ao seu público, mesmo não sendo algo tão alarmante, apesar de uma sequência simples e bem conduzida. No entanto, o longa acaba deixando de lado a brutalidade para se focar em fatalidades mais pessoais, causando a ausência da selvageria que era para ser algo central.

Sua trilha sonora bruta e com altos acordes descreve bem as poucas situações empolgantes que Justine acaba passando ao decorrer das suas primeiras semanas acadêmicas, que cria uma linda sinfonia de tédio, desespero, medo e romance na vida da protagonista.

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Em diversas situações, Grave parece que é um trabalho feito em conjunto, ou seja, a sensação que se tem é que diversas pessoas dirigiram várias cenas e depois juntaram tudo para formar um único meio de entretenimento. A prova disso seria: perspectivas sem significado e com enigmas sem sentido, comédia leve e sem graça em cenas sérias e a bipolaridade de certos personagens, afinal, é tão simples assim uma pessoa que não come nada derivado de animais e após ser forçada a comer carne, apenas vomitar, alguns segundos depois esquecer da situação e não criar trauma algum?

Em compensação, sua ótima fotografia sem filtro e com baixa luminosidade consegue compensar alguns erros que são vistos no decorrer de sua história.

Deixando de lado a bipolaridade de alguns indivíduos, os atores entregam uma boa e memorável atuação, dando a impressão que certas ocasiões aconteceram de verdade e que aquelas pessoas realmente tinham um laço de afetividade entre si. O drama de cada personagem também deve ser mencionado e destacado, conseguindo mexer com as emoções do seu telespectador, fazendo um trabalho bem feito e nos mínimos detalhes.

Mesmo sendo bem ”elaborado”, seu encerramento é uma saída fácil para explicar os defeitos das irmãs Justine e Alexia, algo que poderia muito bem ser tratado com mais naturalidade e leveza, mesmo sendo um plot twist considerável. Várias pontas são deixadas para uma eventual continuação, mas é improvável que a sua sequência seja feita, já que Raw é uma produção redonda e contida.

Como citado anteriormente, minha experiência com Grave não foi tão agradável como esperado, principalmente com o objetivo de me chocar e sentir desconforto em meu corpo. Outra coisa que eu gostaria de citar, é que mesmo tendo um certo tipo de ”fissura” por esse universo de canibais, nunca comi carne humana e não pretendo. Espero que tenha gostado, até a próxima e procure sempre checar o fornecedor de seus alimentos. 😉

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Sobre o Autor

Daniel Estorari

With great powers...