Quadrinhos

Jim Lee diz que indústria de quadrinhos está ruindo e a DC irá salvá-la

Escrito por Gabriel Faria

Não é de hoje que os quadrinhos de super-heróis tornaram-se uma mídia de segundo ou terceiro escalão quando comparada ao cinema e TV, e até aos jogos de videogame. O publisher da DC Comics Jim Lee disse em entrevista ao Movie Pilot alguns detalhes deste fato que é de conhecimento geral:

Nós temos que parar o colapso da indústria de quadrinhos“, disse Jim Lee. O mercado norte-americano de quadrinhos passa por crises que englobam as baixas vendas e a necessidade de editoras como a Marvel repetirem as mesmas estratégias que vieram a fazer o mercado implodir nos anos 90, relançando revistas com novos números e investindo no mesmo estilo de marketing saturado. Apesar dos super-heróis atualmente serem parte de um grande mercado, os quadrinhos não se beneficiam disso da mesma forma. Lee e Dan DiDio, os co-publishers da DC Comics, planejam mudar a situação com a Editora das Lendas, casa dos maiores personagens como Superman, Batman e Mulher-Maravilha.

A iniciativa do Renascimento da DC Comics (Rebirth nos EUA) trouxe de volta o sucesso à editora. Apesar das vendas caírem após algum tempo, a editora mantém atualmente uma parcela significativa do mercado, rivalizando diretamente com sua principal concorrente, algo que não acontecia há alguns anos. Uma das ideias da DC para voltar a criar alguma relevância ao mercado é utilizar conceitos e personagens tidos como sucesso desde os anos 80, alcançando o status de literatura obrigatória para todas as pessoas, e não somente entretenimento barato. Doomsday Clock de Geoff Johns trará de volta Watchmen de Alan Moore, enquanto eles interagem com personagens da DC. Lex Luthor e Ozymandias irão se encarar.

Como Johns já havia atestado, o Renascimento é uma iniciativa que vai contra tudo que os quadrinhos se tornaram na última década, rejeitando a narrativa pessimista e séria e tentando abordar os personagens de forma mais esperançosa, algo que também está refletindo no cinema. DiDio declarou que “os quadrinhos tornaram-se a segunda ou terceira forma das pessoas conhecerem personagens como Batman e Superman, e nós queremos mudar isso.” A ideia para fazer isso é investir em novos tipos de marketing, mudando estratégias e visando não somente viver como a rebarba do sucesso dos filmes e séries, mas podendo permanecer em pé somente com os gibis.

Lee comentou sobre a importância das histórias que nunca envelhecem, como Watchmen e O Cavaleiro das Trevas de Frank Miller. O grande desafio da editora é: como criar novos clássicos, histórias que não dependam de conhecimento da continuidade e cronologia, mas que sobrevivam ao passar dos anos e mudem a indústria? A primeira ideia é trazer de volta grandes nomes, e Jim Lee chegou a mencionar Neil Gaiman em seu painel na SDCC 2017. Ao mesmo tempo, ainda na San Diego Comic-Con, a editora deu indícios do retorno de Sandman e Os Invisíveis, de Grant Morrison, com o retorno de Mark Doyle ao editorial da Vertigo. Foram exibidas artes de Sandman por Jae Lee e Os Invisíveis por Jeff Lemire no clipe de retrospectiva dos 25 anos do selo editorial adulto.

O publisher/artista também falou que, para os roteiristas, serão dados desafios como contar “a melhor história do Superman, a melhor história do Batman, a melhor história da Liga da Justiça.” Esta ideia complementa a declaração de Scott Snyder, que recentemente decidiu se afastar de Grandes Astros Batman para assumir um novo e grandioso projeto que promete mudar o mercado. A declaração de Snyder fala sobre, ao invés de criar histórias mensais, investir em um novo formato que modificaria a visão das pessoas para com os quadrinhos, valorizando arte e roteiro, por ser algo contínuo e fechado de uma só vez e publicado em um formato gráfico diferente. DiDio apelidou esta investida de “uma linha para leitores mais maduros“, inspirada nas cultuadas graphic novels que “permitem que a arte respire.

A DC Comics também pretende investir mais em diversidade e valorizar os artistas envolvidos. Desde abril a editora vem focando na linha Dark Matter, com novos personagens sendo criados por antigos talentos como Jim Lee, John Romita Jr., Greg Capullo e Andy Kubert, focando tanto nos artistas quanto nos roteiristas. Nos últimos anos os roteiristas têm se tornado grandes celebridades, enquanto os desenhistas são subvalorizados. Em contraste, DiDio disse que a parceria entre escritor e desenhista será a chave do sucesso de Dark Matter. Os quadrinhos também são uma mídia visual, afinal de contas.

A linha Dark Matter irá expandir a diversidade dos quadrinhos da editora sem alterar os elementos clássicos da continuidade normal. Este conceito é o oposto da iniciativa da Marvel, chamada Legacy Heroes, que pretende recapturar o estilo dos primeiros anos da editora, ou do início da Image Comics. A ideia de Dark Matter é apostar em algo novo e empolgante. A editora também criou recentemente o selo Young Animal, afirmando a ideia de que a DC não quer mais apostar nas mesmas coisas, sempre tocando as mesmas músicas, comparando-a a uma banda cover. DiDio comentou que 2018 será um “ano de mudanças“, e expressou a esperança de que irão alcançar mais, além do mercado direto, visando aumentar o número de novos leitores enquanto focam também em manter os antigos, que sustentam a indústria há tantos anos. A parceria com editora francesa Dargaud para a produção do Batman de Enrico Marini é uma estratégia para ampliar a marca da DC, indo também para a Europa de forma mais direta, com material produzido também para o público europeu. Mais detalhes aqui.

Algumas estratégias para aumentar as vendas, nos EUA, são repetidas há algumas décadas. Relançar revistas com nova numeração, enquanto a primeira edição possui dezenas de capas variantes ou especiais, é algo extremamente prejudicial e leva a queda das vendas das edições subsequentes. DiDio disse: “Tudo que fazemos com isso é criar obstáculos na forma de comprar quadrinhos. Aumentar preços, capas variantes… Temos que parar. Não podemos investir para que isso seja um negócio morto.” Esta declaração vai de encontro com o recente anúncio da Marvel de que todas as edições de Legacy terão capas lenticulares. Obviamente a DC também se utiliza destes recursos em momentos específicos, como o sucesso das capas lenticulares da saga The Button, mas a ideia é diminuir o uso destes investimentos.

Com o passar dos últimos meses temos observado diferentes investidas das editoras não somente nas suas criações como também na forma de encarar o mercado e quais estratégias pretendem usar. No último ano a DC reverteu alguns anos de declínio nas vendas, enquanto a Marvel promete repetir as ideias que já foram usadas nos anos 90 (revisitar as origens, a simplicidade e o básico do início da Casa das Ideias), provando-se na época um grande sucesso comercial mas que levou à quebra do mercado. De formas distintas, ambas as editoras visam aumentar o alcance dos quadrinhos e chegar a novos mercados, mas o sucesso de ambas as ideias irá depender de como os leitores irão se familiarizar com as novidades.

Os próximos anos serão empolgantes para os fãs, e obviamente precisamos acompanhar de perto todo o desenvolvimento do mercado para poder julgar qual decisão foi mais acertada.

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Sobre o Autor

Gabriel Faria

Assistente Editorial, apaixonado por quadrinhos, redator da Torre de Vigilância, criador do blog 2000 AD Brasil e otaku mangazeiro nas horas vagas.