Ridley Scott tentou explorar mais a fundo a ficção científica da sua franquia renomada Alien com Prometheus (2012) e Alien: Covenant (2017). Infelizmente, embora gostando desses filmes, admito que suas intenções esbarraram em ideias confusas e – por que não? – estranhamente bizarras. Mas os filmes estão ali, tentando abordar temas de natureza mais complexa do que os filmes anteriores, discutindo a origem da humanidade e onde ela se encaixa no grande esquema das coisas. Em Alien: Romulus, o diretor Fede Alvarez também está interessado na ficção científica deste universo, desde a construção de um cenário distópico onde a humanidade se curva ao mundo privado até aos desdobramentos da existência de humanoides entre a sociedade civil. E, se essas discussões são mais bem pontuadas e desenvolvidas aqui, vale mencionar o quão bem-sucedido Alvarez foi se comparado com o mestre Scott.
O êxito do diretor, cuja filmografia demonstra um interesse pelo suspense e o horror, reside na criação de um amálgama da franquia ao colocar o horror do clássico Alien, o Oitavo Passageiro (1979), a ação intensa de Aliens, o Resgate (1986), a maternidade de Alien 3 (1992), e as bizarrices de Prometheus e Covenat em uma mistura só. Assim, Romulus é, definitivamente, uma ode ao passado, que prova que a originalidade não é o único caminho, e beber de fontes certas sabendo o que está fazendo é uma tarefa tão árdua quanto inovar – embora só depender delas também não o faça um grande diretor.
A trama segue a dupla Rain (Cailee Spaeny) e Andy (David Jonsson), cuja irmandade começou quando o pai da garota integrou o humanoide Andy à família, e o deixou com a diretriz de proteger a garota. Eles se envolvem com um grupo de conhecidos na tentativa de fugir do sistema em que estão, a partir de uma carga de módulos de hibernação encontrada numa estação espacial abandonada. Este, portanto, é o cenário perfeito para que o grupo se depare com as criaturas adormecidas devido às pesquisas passadas envolvendo suas origens.
A premissa é simples, mas extremamente eficiente. Ao longo dos primeiros minutos, nos afeiçoamos com a dupla de protagonistas e pela habilidade do roteiro de construir um background entre eles, sem torná-los rasos e apenas um pedaço de carne para ser devorado (ou acasalado). Mas isso não se repete com os outros personagens, que apenas são condicionados a estarem relacionados com Rain e Andy. Como foi dito, o filme sabe explorar sua filosofia ao abordar a existência de Andy e como sua presença pode ser perturbadora para aqueles que são contrários à sua existência. Essa tensão entre os personagens já conduz a narrativa para além do superficial da sobrevivência, e nos oferece uma camada adicional quando coloca em pauta o quanto uma vida vale mais que a outra.
O que oferece um contorno ainda mais interessante é quando a consciência do sintético Rook (Ian Holm), mesmo modelo do famoso Ash do filme original, é transportada para Andy, e a figura inocente do personagem dá lugar à frieza cruel de alguém capaz de fazer o que for necessário para cumprir sua diretriz: entregar os resultados das pesquisas dos xenomorfos à Weyland-Yutani. E essa mudança, além de ser um aspecto brilhante da ótima atuação do David Jonsson, coloca em jogo a relação entre a humana Rain e seu “irmão”, e o quanto ela abdicaria de suas convicções para sobreviver.
De um ponto de vista estético, há muitos elogios para se fazer em relação às escolhas do diretor de fotografia Galo Olivares. Com um bom uso de luzes e sombras, o filme consegue explorar o seu cenário de modo a construir toda aquela sensação de perigo e solidão, seja através do vermelho presente em sinalizadores e sinais de alerta pela estação, às sombras dos corredores que sempre ameaçam guardar algum susto – ou surpresa desagradável. Gosto de como a protagonista é retratada como a Ripley dessa jornada, a colocando como a grande heroína da história. Outro fator que contribui ao horror são os ótimos efeitos práticos que tornam as ameaças mais verossímeis e incômodas só pela sua movimentação estranha; a maquiagem também reforça o horror com corpos estraçalhados, perfurados, dignos de um filme gore.
Além disso, a ação é outro elemento presente aqui e bem conduzido. Devo destacar a cena envolvendo as secreções/substâncias ácidas dos Aliens, e quando elas estão espalhadas num andar sem gravidade. A beleza estética fala por si só, e a tentativa de escapar de qualquer ferimento é a sequência mais apreensiva do longa.
Infelizmente, a apreensão dessa cena não se repete ao longo do filme. Mesmo fazendo um trabalho competente, não me encontrei imerso em quase nenhum momento de Romulus. A sensação de perigo, a claustrofobia, o receio, o medo pelos personagens são emoções esperadas que não estiveram presentes durante a minha experiência. É como se o filme se contentasse com soluções fáceis e convenientes, e não trouxesse soluções mais interessantes, e desperdiçasse seus ótimos comandos artísticos na fotografia, na maquiagem, no figurino e no design de produção. Cito aqui uma cena onde o silêncio se faz fundamental para não alertar as criaturas e de repente surge uma voz na transmissão de rádio alertando a todos no local. Se Alien: Romulus for sua primeira experiência de terror nos cinemas, talvez essa cena, entre várias outras, surta o efeito pretendido.
Basear-se nas fontes boas e saber trabalhá-las é o grande destaque deste filme, mas também é seu principal obstáculo: o potencial esbarra nas suas inspirações. Embora Romulus possua um início particular e imersivo, que prometia um desenrolar mais intimista e amedrontador, ele respeita tanto seus antecessores que acaba esvaindo-se de ideias criativas, não necessariamente originais. Desse modo, acaba encerrando sua história de forma diametralmente oposta ao seu início: óbvia e comum. E isso não faz jus ao bom filme feito por Alvarez.