Séries

A comédia e a relevância de The Chair

Escrito por Thaís Morgado

Chegou ao catálogo da Netflix neste mês a nova série protagonizada por Sandra Oh, atriz muito conhecida por seu trabalho no famoso seriado Grey’ s Anatomy e no aclamado Killing Eve, onde a atriz pôde mostrar ainda mais de seu talento, tal como nesta nova produção.

Criada por Annie Wyman e Amanda Peet, a trama se passa na Universidade Pembroke, e a Dra. Ji-Yoon Kim (Sandra Oh) se torna chefe do Departamento de Inglês. Aqui, acompanhamos a protagonista passar pelos desafios de ser a primeira mulher não-branca a comandar a renomada universidade, com todos os problemas do racismo fortemente presente ali, além de polêmicas e cancelamentos, o decaimento no número de matrículas, a dificuldade dos professores em se adaptar às mudanças do ambiente acadêmico, sua relação com colegas de trabalho e a vontade de propor modificações neste meio tão dominado pelo patriarcado. Ainda, volta um olhar para sua vida pessoal, onde ela cria sozinha sua filha pequena, apesar da relação problemática entre elas. Todas essas adversidades aumentam a pressão sobre Ji-Yoon, mas não tornam a série pesada como parece. Pelo contrário, ela manifesta suas críticas sociais através de um humor sofisticado e ao mesmo tempo ácido, o que torna o produto final mais suave e leve. 

The Chair', da Netflix, conquista com leveza e humor ácido de Sandra Oh | VEJA

Abrindo com uma fotografia intimista e bastante particular, começamos a nos ambientar no espaço onde a série se passa. Iniciar o primeiro episódio assim já serve como uma imersão à história, e o cenário também serve para tal, visto que com um ambiente acadêmico e espaços elegantes, foge-se do que quase sempre se vê nas produções ambientadas em faculdades, onde tem as clichês festas de fraternidades. Além disso, já nos primeiros minutos do primeiro (1) episódio, é estabelecido o tom que o seriado quer seguir, com seu humor orgânico e ácido por vezes, que não te faz gargalhar, mas cumpre com seu aparente propósito. The Chair não demora para fazer suas análises ao sistema de ensino, que cada vez mais se transmuta e evolui, e com isso vem a dificuldade de muitos professores para se adequar aos novos métodos, tão diferentes de outrora. 

Talvez a melhor característica da série seja a tentativa de estabelecer uma relação entre o antiquado e o atual e suas diferenças. Isso ocorre não só no âmbito acadêmico, mas em valores sociais, linhas de pensamento, questões sobre a minoria, a supremacia de homens brancos em altos cargos e o machismo. Questões essas que são abordadas ora em críticas com seu modo sarcástico -e que tem sucesso em passar a mensagem pretendida-, ora em diálogos dramáticos mas que não deixam o clima da série denso. Vê-se isso até sem diálogos, como no quarto (4) episódio, onde os alunos realizam uma aula dinâmica e diferenciada, enquanto o professor mais velho, interpretado por Bob Balaban (Caçadores de Obras-Primas), observa como os tempos mudaram e o ensino passa por transformações. Na cena em questão, isso fica claro pela sua expressão facial ao se deparar com métodos diferentes. “A disciplina teve avanços e você ainda está preso em outra era” é a frase dita pela protagonista, que define todo o objetivo da obra e no que ela se pauta, visto que alguns não querem reformas por serem tão apegados ao arcaico. Temáticas como os problemas que vem com a adoção também se fazem muito presentes. O relacionamento entre mãe e filha se mostra transtornado, porém com a comédia fortemente evidente. Esse ponto coopera para que o assunto não se torne maçante, principalmente por ser desenvolvido em todos os episódios. 

Students protesting a professor played by Jay Duplass

O maior destaque da série é o protagonismo de Sandra Oh, que tem carisma de sobra e uma atuação bastante cativante, dando sempre um toque de personalidade e presença aos seus papéis. Através de sua interpretação, simpatizamos com a personagem e seus objetivos, pois o seu modo tão extrovertido de atuar nos aproxima mais da história. A atriz consegue dar seu tom único em seus diálogos, tanto engraçados quanto dramáticos, assim como a carismática Holland Taylor, que interpreta a cômica e determinada professora Joan Hambling, que tenta combater o machismo sofrido no departamento. Com suas frases francas e afiadas, ela é também o ponto alto da série. Positivamente falando, todo o elenco se relaciona muito bem nas telas, com uma relação caricata e genuína, assim como seria a relação pessoal entre professores, algo que torna o enredo mais natural.

The Chair", com Sandra Oh, e mais destaques desta quarta | GZH

No entanto, o defeito da série é não instigar ao próximo episódio, e não conseguir despertar muito interesse da parte do espectador na narrativa, sendo cada episódio muito parecido um com o outro. Dito isso, a escolha de apenas seis capítulos, com vinte a trinta minutos cada, foi uma ótima escolha para que a série não se tornasse fatigante e sim um passatempo leve, como uma boa pedida para se ver em uma tarde, pois ela não se torna rápida demais, nem enrolada demais. Vale dizer que a série merece uma segunda temporada, para que as possibilidades de arcabouços socioculturais que ela ainda pode trazer possa ser mais explorado, mas também para expandir arcos dos outros professores e da relação de Kim com o professor Bill Dobson (Jay Duplass), que se mostra bastante realista por expor as pedras no caminho desse relacionamento.

The Chair traz uma abordagem pouco explorada no mundo cinematográfico, e com um roteiro bem feito se torna uma das boas surpresas da Netflix para o ano de 2021. A série não chama atenção pelo fato de não ser do gosto geral dos assinantes, como ficção ou romance, mas traz temas tão necessários que deveriam ser vistos por todos, trazendo uma visão crítica de mundo e da esfera acadêmica através de um humor refinado e prazeroso de assistir.

Nota: 3/5 – Prata

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Thaís Morgado

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