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Primeiras Impressões | The Rising of the Shield Hero

Escrito por Vini Leonardi

Se tem uma coisa na indústria de animês que está mais saturada que o Reclame Aqui depois da Black Friday, com certeza é o gênero “isekai“. Eu sou um cara que gosta de clichês e que curte sempre as mesmas coisas repetidas vezes, mas mesmo pra mim… Putz mano, isekai já tá forçando a barra, não é mesmo?

Acontece que japonês é um povo estranho e não pensa assim, e continuamos com nossa leva sem fim de animês isekai sendo adaptados das mais diversas fontes. E como você pode imaginar, o que vamos falar hoje é justamente um isekai vindo de uma Light Novel.

Escrita por Yusagi Aneko, “Tate no Yusha no Nariagari” (lit. “A ascensão do herói do escudo“), como você pode suspeitar, fez relativo sucesso lá pela terra do sushi. Vendendo aproximadamente 3,3 milhões de cópias, recebeu adaptação em mangá, spin-offs e tudo que você tem direito.
Só quando foi licenciado nos Estados Unidos, pela One Peace Books, que sua “fama” cresceu no oeste. E eu uso as aspas pois a fama que Shield Hero tem no ocidente não é nada boa.

Você raramente vai me ver falando sobre assuntos polêmicos “da atualidade” pois do meu histórico, a maioria das pessoas que falam, não sabem do que estão falando. Eu incluso! Por isso, prefiro apenas omitir minha opinião sem embasamento (e queria que mais pessoas fizessem o mesmo). Mas quando o dever chama, acabamos precisando comentar. E é o caso aqui. A tal “infâmia” de Shield Hero se dá por conta de alguns temas delicados no ocidente.

Basta ler a sinopse, que você já identifica o primeiro: o protagonista, Naofumi Iwatani, é – falsamente – acusado de assédio sexual, e perde praticamente tudo que tinha recebido ao chegar no mundo alternativo. É um assunto complicado, ainda mais nos dias atuais, onde mais e mais alegações de assédio surgem na mídia. Foi um lançamento na hora errada, e no lugar errado.
Já o segundo não está tão escancarado, mas nota-se logo de início: como o autor e sua personagem principal lidam com o já famoso tropo de “escravidão num mundo alternativo“. Acho que não preciso entrar em detalhes sobre qual a causa da discórdia aqui, né?

Aquele momento que a personagem secundária é self-aware.

Da mesma forma que recentemente tivemos um surto da utilização da violência sexual como ferramenta de roteiro (Goblin Slayer, Sword Art Online Alicization, entre outros), vemos as alegações contra Shield Hero dividindo opiniões. Há quem diga que é apenas uma ficção e que esse tipo de ação só serve como engrenagens para girar a obra; e há quem diga que essas coisas são inaceitáveis, independente de qual o meio ou por qual motivo elas são empregadas.

Qualquer que seja sua opinião sobre o assunto, acontece que o autor já escreveu o negócio, e tal negócio já foi adaptado em animação, e cá estamos nós. Eu estava legitimamente surpreso com a qualidade da escrita nos primeiros momentos da obra. A reação das personagens aos acontecimentos eram muito reais e convincentes, dentro do pouco que nós conhecemos delas. Nos quarenta e tantos minutos iniciais da obra (que teve um primeiro episódio duplo), eu realmente me vi simpatizando com o pobre herói do escudo.

Mas… O resto dos episódios aconteceu. A história e o protagonista deram uma virada tão grande, tão rápidos, que eu quase fiquei zonzo. Do nada, tudo se tornou sombrio e forçado demais, parece que o autor se esforçou pra fazer com que o roteiro se tornasse o mais edgy possível. Forçou tanto, que acabou fazendo até com que sua personagem principal se descaracterizasse completamente. O pior é que logo depois, ele começa a mesclar as “duas personalidades” do cara, e o herói do escudo se torna um herói inconsistente, tentando ser edgy e fofo ao mesmo tempo. Simplesmente não dá.

Outro ponto a se levantar é sobre a construção de mundo. Não é incomum uma ambientação acabar sendo muito mais legal do que uma história (como eu vivia dizendo sobre Re:Zero). E o mundo de Shield Hero é um desses casos interessantes… Ao menos no papel.
Um reino com profecias antigas proclamando o fim dos tempos; problemas sociais e preconceitos conduzindo o subconsciente popular e corrompendo pessoas; uma sociedade matriarcal, onde a mulher é a autoridade maior. Mas quando vemos a realidade, temos apenas uma trama genérica sobre heróis que salvarão o mundo; uma sociedade escravocrata e que não tem nenhum desconforto com o seus preconceitos; e um reino matriarcal que é governado… Por um homem. São boas ideias, mas que ficam só no campo das ideias mesmo e nunca são executadas.

Ao menos a gente consegue salvar qualquer coisa através de memes, não é mesmo?

Quando olhamos para a parte técnica, porém, não há nada sobre o que reclamar. A animação está linda (pelo estúdio Kinema Citrus), a dublagem me deixou boquiaberto (meus destaques vão pro Kaito Ishikawa, Yoshitsugu Matsuoka e pra Asami Seto, o Herói do Escudo, o Herói da Espada e Raphtalia, respectivamente), as músicas fazem jus ao momento (por Fumiyuki Gou), e por mais conturbado que seja o material original, a direção fez o que pôde para torná-lo assistível (palmas para Takao Abo). É uma equipe e tanto trabalhando para tentar tirar leite de pedra.

A conclusão que se pode tirar é que se não parecesse tanto ser uma ficção de auto-realização vingativa, o show poderia ser melhor. Ele tem algumas ideias boas e algumas personagens interessantes, o único problema é que tudo isso é deixado em segundo plano, para dar foco a uma vingança forçada e que se esforça para parecer “adulta e sombria”, quando na verdade acaba tendo um efeito contrário, fazendo-a parecer boba e sem sentido.

Com o que temos pra hoje, a obra fica muito abaixo do que poderia ser, e embora ainda seja assistível, beira o medíocre e não traz muito divertimento. As primeiras impressões sobre o herói do escudo o deixam com uma nota de 4/10, e só podemos torcer para que o desenvolvimento da trama faça com que as partes boas sobreponham as partes ruins, que tiveram o foco até então.

Você pode assistir a The Rising of the Shield Hero pela Crunchyroll, que faz a transmissão simultânea com o Japão, com novos episódios todas as quartas-feiras.

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Sobre o Autor

Vini Leonardi

Cavaquinho na roda de pagode da Torre. Químico de formação, blogueirinho por diversão e piadista de vocação. "Acredito que animês são a mídia perfeita para a comédia, e qualquer tentativa de fazer um show sério é um sacrilégio", respondeu ao ser questionado sobre o motivo de nunca ter visto Evangelion.