Histórias de fantasias sempre me despertam pensamentos como: “o que irei encontrar nesse livro que possa ser diferente de outros?”. Todo livro de fantasia tem a sua identidade, seja com teor político, ou amizades, ou uma bela história de amor, aquela história de que o herói precisa se firmar no mundo… então temos criaturas fantásticas, mundos incríveis, lugares mágicos e pessoas com poderes especiais. O que eu encontraria em Guirlanda Rubra da Editora Draco? Bem, eu encontrei tudo isso. E encontrei algo que poucos livros do gênero abordam: um tom intimista.
Escrito por Erick Santos, editor da Draco e fazendo a sua estreia como escritor, Guirlanda Rubra apresenta o jovem Garlando Espendi. O herdeiro de uma família de burgueses muito influentes por toda Terra Pátria. Ele segue os padrões de um jovem mimado rico. Sedutor, amante de boas festas e muitas mulheres. Mas o leitor sente que toda essa áurea festiva de Garlando é como um escudo para dores individuais profundas. Onde ele sempre teve que lidar com nunca ter uma escolha para a sua vida. E sempre lidar com perdas. Seja na morte de seus pais, quando a única mulher que amou, Celestiana Tessitore, a popular Celes, tem que ir embora para outra cidade e o deixa e quando a sua tia Reggiane quer que ele assuma os negócios da família. Toda riqueza, sedução e destreza de Garlando nunca o fez independente. Ele sempre teve seu destino programado por alguma coisa ou alguém. E é justamente aí que a leitura é intimista.
Quem nunca foi o jovem que já se sentiu sendo “manipulado” ou “guiado” para viver uma vida programada? Quem nunca quis viver para aproveitar o máximo possível de uma festa sem pensar no amanhã? Esse conflito sofrido por Garlando me pareceu muito latente. Me impressionou. E ainda mais sabendo que Erick Santos começou a elaborar toda a história há mais de 15 anos, em uma época em que o jovem escritor poderia estar vivendo conflitos de como seguir na vida como o personagem principal. Considerando esse fórum íntimo, o personagem estreita laços com o leitor facilmente. A ponto de você lembrar e assimilar histórias suas com Garlando. Mesmo quando chega o momento de ruptura da “inocência”, onde precisa assumir a postura do herói, ainda é possível se prender e espelhar.
Mas o destaque fica mesmo na narrativa adotada. Em Guirlanda Rubra, a narrativa é leve e de muito fácil entendimento. As palavras são usadas de forma cadenciada mas ao mesmo tempo, são diretas em suas informações. Por que sendo o primeiro livro onde um novo mundo é apresentado, muitos autores se fixam em explicar geografias, costumes, gestos, sotaques etc e tal. A escrita do Erick explica com jeito, economicamente, mas não deixa de ser rica. Ela transporta facilmente o leitor para a cena. Eu senti isso logo de cara, no começo do livro. Em uma sequencia de ação. Onde envolve magia e lutas, é possível sentir os pontos de desespero e satisfação de alguns personagens. E como é uma história de amadurecimento, o livro segue Garlando nesse processo. A primeira parte é bem mais leve, e a partir da segunda sente-se um peso na trama que segue assim por diante.
A miscelânea de influências também se destaca em Guirlanda Rubra. Erick pegou coisas que gosta e as transmutou para a trama sem parecer forçado. Magia, tecnologia, personagens que parecem de etnias diferentes… tudo bem encaixadinho sem atropelar ou encher linguiça. O que me incomodou foi uma falta de conhecer ou aproveitar mais os outros personagens. Temos um foco totalmente em cima de Garlando, que é totalmente compreensível até. Mas ficou um gosto de que os outros personagens poderiam ser bem mais trabalhados. Como a proposta é apresentar um novo mundo e acompanhar Garlando nesse primeiro livro, é normal isso.
Outro grande trunfo de Guirlanda Rubra são as ilustrações. O desenhista Abel apresenta personagens ricos em detalhes com traços muito bonitos e pomposos. A capa em si já é um espetáculo a parte, lembrando antigos livros de RPG de Steve Jackson e Ian Livingstone, ou em filmes de fantasia fantástica. Essa ambientação visual contribui muito para o leitor se ambientar na trama, o que é muito favorável para leitores novatos e para leitores experientes. É um traço com tantos detalhes, mas que ao mesmo tempo não são confusos e de fácil entendimento.
Guirlanda Rubra é um excelente começo de Erick Santos como escritor. Ele conduz bem a trama que apresenta um novo mundo, rico em detalhes com uma fácil narrativa. Muitas vezes me senti “jogando” um Final Fantasy para os antigos consoles de 16 BITS. A Editora Draco iniciou uma campanha de financiamento coletivo no Catarse para disponibilizar a publicação e fez um podcast com mais detalhes. Os links estão abaixo:
Podcast Imaginários #14 – Guirlanda Rubra