Ao se deparar com a premissa de Bright, novo filme do diretor David Ayer em parceria com o astro Will Smith, é quase impossível não compará-la com a de Distrito 9 (2009), dirigido por Neill Blomkamp. É visível o objetivo de Neill em discutir questionamentos sociais e, principalmente, humanitários, quando se coloca aliens e humanos juntos na Terra, onde os extraterrestres são completamente oprimidos e segregados da humanidade em uma metáfora que retoma o Apartheid e outras divisões existentes atualmente. Usando essa mesma estrutura, Ayer utiliza sua fantasia misturada com ficção, tentando trazer debates semelhantes entre orcs, elfos e humanos, porém, diferente de suas inspirações, o filme joga fora várias oportunidades em construir um discurso inteligente e sério, se perdendo na ação excessiva e na maldita necessidade de colocar seu astro hollywodiano em cada frame.
Will Smith sempre foi uma peça importante para seus filmes. Sua presença de tela incrível aliada a suas próprias habilidades de atuação e conseguir extrair diversas emoções dos personagens foram alguns dos motivos que o fizeram a ser o grande ator que é. Infelizmente, as vantagens do ator acabam caindo na péssima prática publicitária de diretores e produtores em colocarem seu rosto em cada momento do filme, em pôsteres e publicidades, apagando outros personagens e até atrapalhando o ritmo da própria história. E, enquanto seu personagem, Scott Ward, consegue transmitir a mensagem necessária ao público, do policial negro que está em constante luta diante da exclusão de seus companheiros, a falsa necessidade atrapalha o desenvolvimento de Joel Edgerton, que deveria ser mais reconhecido.
Não só por seu excelente trabalho em caracterização como orc, mas a atuação timída e ao mesmo tempo cômica traz bastante receptividade entre Nick Jakoby e o espectador. A dinâmica entre a dupla Smith e Edgerton funciona e impressiona pela proximidade, mas, como dito excessivamente no parágrafo anterior, Jacoby poderia ter tido um desenvolvimento mais inteligente de certa forma. Se o filme está se vendendo o tempo inteiro como a exclusão de orcs dentro da sociedade e, do protagonista, dentro da polícia, faltou grande tempo de tela e demonstrações por parte do roteiro.
Como mistura de gênero: sci-fi, fantasia, ação e até comédia, Bright está frágil nessa relação. No sci-fi, David Ayer flerta bastante e em quase todos seus discursos fala sobre as questões que estão na trama, mas se elas só são refletidas numa introdução que deixaria Zack Snyder orgulhoso, além da trilha sonora, sem mais nenhuma exemplificação nítida, estas se tornam fracas, rasas e desinteressantes. Na fantasia, orcs e elfos têm uma maquiagem exuberante e detalhista, só que a representação por meio das atuações é pífia e chega até ao ridículo de elfos fazerem piruetas excessivas. Há outro flerte que é o dragão, sem nenhuma menção anterior, em um rápido plano geral desnecessário e que falha na tentativa de ambientação.
O diretor, entretanto, não chega a decepcionar em todos os gêneros. Como ação e comédia, Bright é extremamente agradável. Não é repleto de piadas isentas de graça e sem timing, há várias passagens que despertam facilmente o riso, principalmente pela dupla protagonista que tem os melhores diálogos. Em um feito muito parecido com Esquadrão Suicida (2016), a ação bem feita e produzida por Ayer é frenética e de difícil acompanhamento pela edição defeituosa, mas traz um efeito violento eficiente – remete aos filmes de gângster.
Bright é muito mais o flerte de seu diretor do que filme de “ficção com ação”. Apesar de ter uma excelente dupla como protagonista, suas decisões desperdiçam oportunidades complexas e promissoras, deixando as mensagens apenas nos discursos promocionais de sua equipe. Ao final, há um pequeno gancho para uma possível continuação, e que isso aconteça! Porém, com outros caminhos a serem percorridos, já que esse universo parece muito rico e, se for explorado corretamente, poderá se tornar uma das melhores produções da Netflix.