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Rocky: Um Lutador | O conto de fadas completa 40 anos

Escrito por Ricardo Ramos

Dia 3 de dezembro de 1976. Foi nessa data em que Rocky Balboa subia no ringue pela primeira vez para se tornar um dos personagens mais queridos e famosos da história do cinema mundial. O filme estrelado por Sylvester Stallone chegava às salas de exibições americanas como uma grata surpresa. Tanto para o público, para a crítica e até para o próprio estúdio. Menos para Stallone e as pessoas que embarcaram com ele para a realização do clássico. O filme rompe gerações e ao completar 40 anos, o personagem conviveu, cresceu e arrebatou muitos fãs e soube renovar uma nova quantia com o recente Creed: Nascido para Lutar.

Como disse Vicent Canby, crítico do The New York Times, que assistiu a première 13 dias antes da estreia no circuito dos EUA: “é um faz de conta à moda dos anos 30”. A história de Rocky, um boxeador amador da Filadélfia que trabalha paralelamente como capanga de um agiota, que tem como única e maior ambição na vida, até então, de namorar a irmã do seu melhor amigo Paulie, acaba tendo a sua vida transformada quando o campeão peso-pesado Apollo Creed lhe dá a oportunidade de disputar o título máximo do boxe. Realmente as semelhanças de contos de fadas, como Cinderela ou Patinho Feio são inevitáveis.

Cartaz do filme

E as semelhanças não lhe dão somente no enredo do filme. A própria produção tem um ar de Gata Borralheira. Stallone é a Cinderela tanto como Rocky, como na vida real. Na época ainda desconhecido, o aspirante a ator rodava por produções que iam do filme pornô The Party at Kitty and Stud’s (1970). O pornô para pegar a onda do sucesso do ator em Rocky, foi relançado anos depois com o nome de Italian Stallion (Garanhão Italiano). Stallone esteve em pequenas participações em filmes de Woody Allen, Jack Lemmon. Participou de algumas séries e protagonizou dois filmes Rebel (1970) e The Lords of Flatbush (1974). Mas nada marcante que alavancasse a carreira de ator.

Nessa época Stallone estava muito mal financeiramente. Ele chegou a roubar as poucas joias que sua mulher tinha e as vendeu para pagar dívidas. Chegou morar na rua, e a ruína chegou quando teve que vender seu cachorro em uma loja de bebidas para um estranho qualquer por 25 dólares, pois não tinha dinheiro para alimentá-lo. Algo que fez chorando. A vida tinha jogado Stallone na lona. Foi quando depois de assistir uma luta de boxe entre Muhammad Ali e Chuck Wepner se inspirou em fazer o roteiro de Rocky. Na luta, Wepner conseguiu resistir a 15 rounds contra Ali, inclusive chegando a derrubar o campeão em certo momento da luta. O roteiro foi escrito em três dias e meio.

Rocky Balboa contra Apollo Creed

O segundo round foi vender o filme. Quando a United Artists se ofereceu para comprar o roteiro com uma oferta de US$ 125 mil dólares. Mas Stallone fez um pedido. Ele queria estrelar o filme. Os executivos disseram que não. Ele não era o ator certo para o papel. E lhe aumentaram para US$ 250 mil e depois US$ 350 mil. Duplamente recusados pelo ator. O estúdio queria nomes como Ryan O’Neal, Robert Redford, James Caan ou Burt Reynolds como Rocky. Mas diante da insistência de Stallone, eles aceitaram a proposta, Mas pagaram US$ 35 mil. Stallone então pegou o dinheiro e voltou para frente da loja de bebidas para comprar seu cachorro de volta. Esperou por três dias até o homem voltasse. Que recusou em vender por US$ 100 dólares, o ator então ofereceu 500, e teve uma nova recusa. O negocio foi fechado por US$ 15 mil, no mesmo cachorro que ele vendera por US$ 25 dólares. Round vencido por Stallone.

Como visto até aqui, a produção de Rocky se confunde um pouco com a vida real do seu astro. Nunca desista é a lição de moral aprendida com o filme. Por mais que ele trate o boxe, Rocky lida com a linha tênue da vida onde diz se o que queremos vale a pena lutar. O filme não é somente sobre boxe. O boxe é o pano de fundo. É sobre viver o sonho e aproveitar dele o máximo possível. Mesmo que todos em volta desacreditem. O próprio ano de 1976 não é a época dos lutadores ítalo-americanos, como era o personagem, já não tinham tanto destaques de outros tempos. Era o domínio de afros descentes e dos latinos no esporte.

Elenco de Rocky: embaixo – Burgess Meredith, Sylvester Stallone e Talia Shire. Parte de cima: Burt Young e Carl Weathers

A produção de Rocky teve inicio e a sua gravação foi feita em rápidos 28 dias. John G. Avildsen assumiu a direção. O cineasta até então nunca tinha visto uma luta de boxe ou qualquer filme do gênero. Com um orçamento apertado, por imposição do estúdio, Stallone colocou a sua família para trabalhar nas filmagens. Seu pai soava o gongo nas lutas, seu irmão interpretou um artista de rua e Sasha, a sua primeira esposa, foi responsável pela fotografia.

Talvez o nome mais badalado da produção fosse o da atriz Talia Shire, que fez Adrian Pennino, o par romântico de Rocky, Talia, que é irmã do diretor Francis Ford Coppola, tinha participado de O Poderoso Chefão (1972) e O Poderoso Chefão II (1974), onde tinha sido indicada ao Oscar de Atriz Coadjuvante. Carl Weathers deu vida ao impagável Apollo Creed (Apollo Doutrinador aqui no Brasil), Burgess Meredith fez o ranzinza treinador Mickey Goldmill (papel que conseguiu por nenhum ator querer fazer teste) e Burt Young fez o Paulie Pennino, cunhado e melhor amigo de Rocky.

Adrian Pennino (Talia Shire) e Rocky Balboa ( Sylvester Stallone) no primeiro encontro no filme.

Entre orçamentos baixos, o valor inicial era de US$ 2 milhões que foram reduzidos pela metade, pois o estúdio tinha o receio de prejuízo por ser tratar de um desconhecido como protagonista, atores dividindo minúsculos camarins e algumas mudanças de cenas, o longa ficou pronto e estreou para pegar os consumidores de filmes no final do ano. Alguns cineastas hollywoodianos estavam seguindo a onda que tinha se instalado desde Easy Rider (Sem Destino aqui no Brasil) do ano de 1969. Os diretores estavam praticando o que foi chamado de Easy Rider Generation. Um termo usado para os cineastas contestadores que afloravam na época. O filme antes do seu lançamento, foi meio que deixado de lado pelos grandes nomes de Hollywood. Os cineastas buscavam fazem produções com o realismo de Taxi Driver dirigido por Martin Scorsese, que até então era o grande filme de 1976. E Rocky ia ao contrário dessa onda. Era o conto de fadas. Lidava com o sonho. Jogou no imaginário do povo um personagem, que tinha descendência italiana, enfrentando um boxeador matreiro que usa um calção com as cores da bandeira americana. Era realização do Sonho Americano por um imigrante. Houve quem torcesse o nariz para o filme.

Mas o público abraçou o conto de fadas. E junto com ele veio à crítica. E o que era um desconhecido como ator no papel de protagonista se tornou em indicado ao Oscar de Melhor Ator e o filme teve outras oito categorias. A produção que teve orçamento de US$ 1,1 milhão arrecadou US$ 225 milhões e três Oscars. Melhor Filme, Diretor e Montagem.

 Bill Conti compôs a trilha sonora e o famoso tema “Gonna Fly Now”. A música imortalizou nas cenas dos treinos de Rocky, e quando ele corre pelas as ruas da Filadélfia. Transformando a cena das escadarias do Museu de Arte da Filadélfia, em uma das mais inesquecíveis da história do cinema mundial.

O filme estreou aqui no Brasil com o nome de Rocky: Um Lutador, em janeiro de 1977, já seguindo o burburinho do sucesso que era nos EUA. Mas foram as exibições na TV, com a inconfundível dublagem de André Filho (falecido em 1997) que popularizaram Rocky por aqui.

O sucesso de Rocky rendeu ao filme seis continuações, todas elas foram lucrativas. A única que capengou mais foi o Rocky V. Mas no saldo final a receita da franquia soma-se por volta de US$1,1 bilhão. Sequências que transformaram o personagem atemporal. O primeiro filme era de 1976. Lembro-me de quando criança assistir muito os filmes do Rocky Balboa pelas Sessões da Tarde e Telas Quentes da vida. Uma época sem internet, Netflix, Youtube… e deixou o personagem vivo na mente de todas as pessoas. Seja para fazer uma paródia, para fingir boxear o ar assobiando a famosa música ou simplesmente para assistir o filme de novo. Ao se manter vivo durante 40 anos, Rocky venceu a luta.

O conto de fadas da Cinderela que mal sabe falar direito, lutava boxe e atendia pelo apelido de Garanhão Italiano, completa 40 anos ainda conquistando gerações. O que Rocky nos brinda é o fator perseverança. Para se ter um lugar no mundo tem que perseverar. Tem que tentar e fazer valer a tentativa. Ainda bem que Stallone não jogou a toalha e persistiu no sonho de Rocky Balboa. Ainda bem para ele. Ainda bem para nós. Obrigado Stallone!

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Sobre o Autor

Ricardo Ramos

Gibizeiro, escritor, jogador de games, cervejeiro, rockêro e pai da Melissa.

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